Estudo realizado pela FGV mostra que pequenos empresários têm a confiança mais baixa; são os que menos conseguiram recuperar a demanda desde o início da crise e encontram dificuldades de acesso ao crédito.
Por Luiz Guilherme Gerbelli, G1
21/07/2020 05h01 Atualizado há 05 horas
Postado em 21 de julho de 2020 às 10h05m
As pequenas empresas do comércio são as que mais sofreram com a crise
provocada pela pandemia de coronavírus. E o pior: o ritmo de recuperação
tem sido fraco.
Os dados estão em um estudo inédito realizado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) e têm como base a pesquisa da sondagem do comércio realizada mensalmente pela instituição.
O levantamento mostra o seguinte em relação ao empresário de pequeno porte:
- O índice de confiança é o mais baixo;
- A recuperação da demanda é a mais fraca desde o início da crise;
- Há mais relatos de dificuldade para conseguir crédito;
- Quase 40% deles esperam a normalização da economia só em 2021.
A dificuldade apontada pela pesquisa indica mais um entrave para a
recuperação econômica do país. As pequenas empresas são responsáveis por
54% dos empregos com carteira assinada e respondem por 27% do Produto
Interno Bruto (PIB) nacional.
Pela pesquisa realizada pelo Ibre, a confiança dos pequenos empresários
ainda segue num patamar bastante ruim e não deu mostras de uma retomada
mais robusta.
Em junho, o índice de confiança dos pequenos empresários marcou 58 pontos, enquanto a dos grandes estava em 80,6 pontos.
Desde abril, quando foi possível capturar todos os efeitos da crise
provocada pela pandemia de coronavírus, as grandes empresas do comércio
perderam 58,8 pontos de confiança e já recuperaram 36,1 pontos. As
pequenas registraram uma queda de 69,5 pontos no período e recuperaram
37,3 pontos.
"O fundo do poço é maior para as pequenas empresas e elas têm tido mais dificuldade para sair dele", afirma o economista do Ibre/FGV e responsável pelo levantamento, Rodolpho Tobler.
O quadro de dificuldade das pequenas também fica evidente quando se
analisa o comportamento da demanda para cada grupo de empresas. Em
março, o indicador que apura esse quesito na pesquisa do Ibre estava em
94,4 pontos para as pequenas. Em junho, marcou apenas 48,6 pontos. No
mesmo período, a demanda das grandes empresas passou de 91,7 pontos para
88,7 pontos.
"O patamar de antes da pandemia já não era tão forte. E, mesmo assim, não está sendo fácil para as pequenas empresas retornar para esse patamar", diz Tobler. O indicador do volume de demanda vai de 0 a 200 pontos – a marca de 100 pontos indica um nível normal de atividade.
O pequeno empresário ainda tem sido prejudicado por ter menos acesso aos programas de crédito do governo.
Segundo o levantamento da FGV, das empresas que tentaram obter algum
tipo de crédito, mas não conseguiram, 64,4% são de pequeno porte, 30,5%
estão no grupo das companhias de médio porte e apenas 5,1% são de grande
porte. "A falta de crédito continua sendo o principal problema para a
retomada", diz o presidente do Sebrae, Carlos Melles.
Em maio, o governo criou o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e
Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) e liberou linhas de crédito para pequenos negócios.
Os empresários, no entanto, relatam dificuldades para ter acesso aos
recursos. Na quinta-feira (16), o presidente do Banco Central, Roberto
Campos Neto, disse que o governo pretende anunciar novas medidas para esse segmento.
Flávia Oliveira: ‘Micro e pequenas empresas têm dificuldade de acesso ao crédito’
As pequenas enfrentam esse quadro de maior dificuldade porque elas têm
uma margem de manobra menor de atuação. Quando a pandemia se agravou no
país e boa parte do comércio teve de baixar as portas, as grandes
conseguiram transferir parte das suas operações para o e-commerce com
alguma rapidez.
Em relação ao crédito, as companhias de menor porte lidam com uma
burocracia maior. Nem todas, por exemplo, têm uma folha de pagamento
atrelada a uma instituição financeira, o que dificulta um relacionamento
com o banco para a tomada de recursos em momentos de necessidade.
"As grandes empresas têm uma estrutura melhor e mais preparada para
enfrentar os tipos de problema que surgem", diz Tobler. "É o caso das
vendas online. No início da pandemia, as grandes já estavam preparadas
(para o e-commerce). As pequenas nem sempre estão prontas."
Da ampliação para a sobrevivência
Com lojas de acessórios femininos em dois shoppings de Goiânia, Goiás, a
empresária Karla de Assis viu a sua fonte de renda ser bruscamente
interrompida com o fechamento do comércio.
Pouco antes da crise sanitária se agravar, Karla conseguiu um crédito
do governo de Goiás. O objetivo era ampliar o negócio com uma terceira
loja ou com um quiosque num shopping. Mas, diante do agravamento da
situação econômica com a pandemia, os recursos do empréstimo acabaram se
tornando a única renda.
Loja da empresária Karla de Assis — Foto: Arquivo pessoal
"Assim que veio a pandemia, nos primeiro 15 dias, 30 dias, eu fiquei preocupada. Eram poucos recursos para um custo operacional tão alto, como é ter uma loja num shopping", diz Karla. "O crédito que seria utilizado para o crescimento do meu negócio foi destinado para a sobrevivência dele."
Para o seu negócio não fechar durante a crise, Karla também teve de
reduzir o seu quadro de funcionário de 6 para 3 vendedores e decidiu
apostar nas vendas online. "Minha empresa não estava preparada para
vender online, mas eu tinha uma presença nas redes sociais. Eu sempre
fiz vídeos da loja, mostrei os produtos."
As vendas online demoraram para engrenar. O primeiro mês foi o pior,
segundo a empresário. Mas hoje já representam 30% do faturamento que ela
obtinha com a venda física. "Eu acho que foi uma vitória muito grande
ter conseguido esse resultado com quase nada de ferramentas em mão."
Futuro de dificuldade
Na leitura dos pequenos empresários, o quadro de dificuldade não deve
mudar tão cedo. O levantamento da FGV mostra que 38,8% dos empresários
de pequeno porte esperam uma normalização da economia apenas em 2021.
Essa relação é de 31% entre os empresários de médio porte e de 28,8%
entre os de grande porte.
Hoje, somente 12,4% das empresas de pequeno porte dizem estar operando normalmente.
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