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terça-feira, 2 de março de 2021

Teste: Porsche Taycan faz história e bate recordes da Autoesporte

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Versão topo de linha do superesportivo elétrico se tornou o carro mais rápido já avaliado nos últimos 56 anos.  
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Por Rodrigo Ribeiro  
02/03/2021 08h54 Atualizado há 05 horas
Postado em 02 de março de 2021 às 14h00m


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O termo “fazer história” perdeu parte de seu valor nos últimos anos, especialmente por conta de seu uso excessivo. Afinal, todos querem que seus feitos sejam suficientes para que eles, efetivamente, se tornem marcos de uma geração. Mas hoje é possível falar com propriedade e sem medo de errar que o Porsche Taycan Turbo S acaba de fazer história na Autoesporte.

Thank you for watching

A expectativa de testar o carro elétrico mais rápido do Brasil era grande e, mesmo assim, os números que Alexandre Silvestre, nosso assistente de testes, enviou direto de Tatuí (SP) surpreenderam a todos. O mais importante deles, claro, é este: 2,93 segundos. Esse é o tempo que o superesportivo de R$ 1,04 milhão gastou para chegar aos 100 km/h. Foi a primeira vez em 56 anos da Autoesporte que um carro conseguiu concluir a prova em menos de três segundos.

Vamos além: nunca antes um veículo avaliado por nós cumpriu todas as provas de retomada com um tempo médio inferior a dois segundos. Para ter uma ideia, isso é tão rápido que essas medições não seriam possíveis se fossem usados os métodos de aferição da época em que a Autoesporte estreou nas bancas. Basicamente, o carro seria mais rápido do que qualquer instrumento feito para aferi-lo.

O visual limpo exigiu que até as maçanetas ficassem embutidas eletricamente na carroceria — Foto: Divulgação
O visual limpo exigiu que até as maçanetas ficassem embutidas eletricamente na carroceria — Foto: Divulgação

É difícil explicar o resultado de tudo isso sem usar adjetivos e figuras de linguagem, então peço desculpas de antemão. Meu objetivo aqui é te levar para andar no carro mais rápido já avaliado pela Autoesporte, e não vou poupar recursos gramaticais para isso. Mas, para começar, vou precisar te fazer uma pergunta indelicada: qual é seu peso?

Velocidade de dobra, senhor Sulu
Não precisa falar o número da balança, apenas multiplique-o por 1,2. No meu caso o resultado é 96 kg. Essa é a força com que o Taycan Turbo S pressiona seu corpo contra os bancos de couro, já que a tração integral e os pneus completam com excelência a tarefa de levar para o asfalto o torque instantâneo de insanos 107,1 kgfm no modo de arrancada. Junte a isso o som eletrônico emulado pelos alto-falantes e você quase irá se sentir como o comandante da USS Enterprise de Star Trek.

É um desempenho tão fora da realidade que 100% dos passageiros que puderam desfrutá-lo davam risadas de alegria (às vezes misturada com nervoso) após terem superado a surpresa de sentirem seus globos oculares e o conteúdo do almoço se deslocarem de maneiras pouco comuns dentro do corpo.

A empolgação, inclusive de quem normalmente não dá a mínima para automóveis, era tamanha que arrisco dizer que esse carro poderia ser a “cura” para a atual geração que prefere lotar as redes sociais criticando o fato de a Porsche usar o nome Turbo para um modelo elétrico. Em tempo, essa palavra passou a ser usada pela marca para identificar os modelos mais rápidos da sua gama. Por isso o 911, cuja maioria das versões é turbinada, só adota o sobrenome nas opções topo de linha (excluindo o GT3).

O interior pode receber inúmeras customizações, incluindo uma quarta tela no painel exclusiva para o passageiro — Foto: Divulgação
O interior pode receber inúmeras customizações, incluindo uma quarta tela no painel exclusiva para o passageiro — Foto: Divulgação

O Taycan também pegou emprestado outros elementos dos esportivos da fabricante, mas todos adaptados para equipar o primeiro elétrico da Porsche. Os (exageradamente) complicados comandos elétricos do difusor do ar-condicionado vieram do Panamera, mas escolher para onde você quer enviar o vento frio ficou mais fácil, bastando escolher a direção do jato na tela. O seletor de marcha é idêntico ao do 911, mas migrou para o painel e aposentou o freio de estacionamento — agora ele é ativado e desativado sozinho sempre que o carro entra ou sai do P (Parking).

Até o comando de partida do motor foi atualizado: ele continua do lado esquerdo, como em todo Porsche moderno, mas virou um simples botão com o símbolo de liga-desliga, igual ao de eletroeletrônicos. E nem precisava, já que o carro liga e desliga sozinho quando a porta do motorista é aberta ou fechada.


Os faróis matriciais adaptativos são de série. Um para-choque com entradas de ar maiores é oferecido como opcional — Foto: Divulgação 

Discreta ostentação
Mas, para alguns, a grande diferença do Taycan está em sua traseira. Ela manteve as lanternas integrais de outros Porsche, mas este é o primeiro modelo da gama atual que não permite a abertura completa e independente do aerofólio traseiro. A peça móvel se ergue em diferentes graus a partir de 90 km/h, mas não é possível deixá-la levantada na hora de estacionar o esportivo em frente a um restaurante da moda. O máximo que o sistema permite é erguer o aerofólio por poucos centímetros para facilitar a limpeza.

Nem adianta forçar: esse é o máximo que dá para levantar o aerofólio do Taycan na hora de estacionar — Foto: Divulgação
Nem adianta forçar: esse é o máximo que dá para levantar o aerofólio do Taycan na hora de estacionar — Foto: Divulgação

A discrição continua ao longo de toda a carroceria: as duas portas dos conectores de recarga não possuem botões aparentes, e são abertas eletricamente ao acionar sensores escondidos no acabamento. As maçanetas parcialmente embutidas só se abrem quando você se aproxima do carro, e quem busca um visual mais esportivo para a dianteira precisa pagar à parte os R$ 14.172 cobrados pelo pacote SportDesign.

Os conectores nos dois para-lamas ficam ocultos por tampas elétricas — Foto: Divulgação
Os conectores nos dois para-lamas ficam ocultos por tampas elétricas — Foto: Divulgação

Aliás, a lista de opcionais é tão grande quanto a lista de espera de oito meses para o Taycan no Brasil. É possível incluir projeção no para-brisa, teto solar fixo panorâmico e até uma tela adicional no painel exclusiva para o passageiro. Deixar o Taycan “completo” custa quase R$ 250 mil adicionais. Mas o carregador doméstico, do tipo Wallbox, é instalado gratuitamente pela Porsche na compra de qualquer versão do modelo.

Por falar em recarga, até nisso o Taycan surpreende. Ele é o primeiro modelo à venda no Brasil capaz de receber até 270 kW de energia, um dos méritos da bateria de 83,7 kWh (efetiva) com tensão de 800V. O fato de só haver dois carregadores deste tipo no Brasil, um em São Paulo e outro em Bertioga (SP), é um ponto negativo. Mas quem puder usá-los não irá se decepcionar, já que com eles 75% da bateria pode ser preenchida em menos de 23minutos.

Esportivo de Schrödinger
Poderia gastar seu tempo falando do acabamento de primeira, de como a Porsche abriu um nicho no assoalho traseiro para melhorar o (ótimo) espaço para os dois adultos que viajarem atrás e do painel com a primeira tela curva em um carro de produção em série. Mas isso são tecnologias mundanas que qualquer veículo poderia ter.

Os nichos na bateria (lado esquerdo) são para acomodar melhor os pés dos passageiros traseiros — Foto: Divulgação 



O legal do Taycan são os recursos feitos para ele andar o mais rápido possível. O melhor deles já falamos um pouco: o modo de arrancada. Ele prepara a bateria e o trem de força para arrancar os 761 cv que os dois motores combinados geram. É nessa situação que o câmbio, recurso exclusivo do Taycan, se faz mais presente. A caixa de apenas duas marchas é acoplada ao motor traseiro e permite reduzir o tempo de aceleração sem prejudicar a autonomia do modelo (de até 412 km pelo ciclo WLTP).

A preocupação da Porsche com a dinâmica é tamanha que o freio regenerativo não foi vinculado ao pedal do acelerador, como em outros elétricos. Segundo a fabricante, a súbita transferência de massa provocada pelos carros em que dá para dirigir usando só o acelerador não condiz com o equilíbrio buscado no Taycan.

A inédita tela curva do painel reúne os comandos dos faróis (esquerda), ESC e suspensão (direita) — Foto: Divulgação
A inédita tela curva do painel reúne os comandos dos faróis (esquerda), ESC e suspensão (direita) — Foto: Divulgação

E tudo isso fez sentido na primeira volta que demos com o modelo em uma pista fechada. Pesando quase 2,3 toneladas, ele seria o pesadelo de qualquer engenheiro, se 630 kg dessa massa não estivessem a centímetros do chão. Isso permitiu uma redução drástica do centro de gravidade e, associada à suspensão a ar com barras estabilizadoras ativas e eixo traseiro direcional, dá ao Taycan um comportamento tão bipolar quanto o gato que virou exemplo de física quântica: ora ele é um sedã confortável, ora é um superesportivo pronto para borrar sua cueca.

Há opção de banco para três pessoas, mas o Taycan é feito para quatro adultos. Repare nos dois conectores USB-C sob o assento central — Foto: Divulgação
Há opção de banco para três pessoas, mas o Taycan é feito para quatro adultos. Repare nos dois conectores USB-C sob o assento central — Foto: Divulgação

A direção elétrica tem respostas quase paranormais, e o modelo encara curvas com uma precisão irritante: não há indícios de saída de frente, traseira, nada. Apenas o barulho dos pneus sofrendo para encarar cargas impossíveis de serem geradas por um carro há 10 anos. Esse detalhe, inclusive, tem feito com que fabricantes como a Pirelli desenvolvam compostos específicos para elétricos, e os 265/35 na frente e 305/30 da linha Elect deram show de aderência e desempenho similar aos Goodyear originais de fábrica.


A tela de controle do ar-condicionado traseiro é similar às dianteiras e permite até o ajuste do fluxo e direção do vento — Foto: Divulgação 

Retomadas são feitas com tanta velocidade que a impressão é de que o carro não tem um pedal, e sim um botão de acelerador. O vigor logo explica a escolha da Porsche em equipar a versão Turbo S com freios de carbono-cerâmica de fábrica: apesar de mais ruidosos e caros, eles lidam com a sobrecarga e o aumento de temperatura como se cada volta na pista fosse igual à primeira. E ainda contam com a força dos motores capazes de gerar até 360 cv de energia a cada freada.

Brutalidade limitada
Normalmente versões topo de linha de superesportivos entregam o desempenho extra que as diferenciam somente em situações muito específicas e quase sempre restritas a locais fechados. No caso do Taycan Turbo S é diferente: seus melhores atributos estão a uma saída de pedágio ou uma ultrapassagem de distância. Dá para se divertir como nunca sem perder sua CNH com infrações em 15 minutos.

A suspensão a ar e barra estabilizadora ativa permitem manter a carroceria equilibrada em quase todas as curvas — Foto: Divulgação
A suspensão a ar e barra estabilizadora ativa permitem manter a carroceria equilibrada em quase todas as curvas — Foto: Divulgação

Mas optar por ele não envolve só pagar R$ 468 mil a mais do que a versão inicial. Os pacotes de entrada, ainda que tenham menos desempenho, oferecem autonomia maior. Além da bateria precisar descarregar mais devagar, a ausência de um motor no eixo dianteiro reduz o peso, com um ganho direto em alcance, que pode chegar a 484 km.

Também é preciso levar em conta os defeitos do modelo, que viram apenas "características" depois desse show de desempenho. Entre os problemas há o consumo (elétrico, claro) elevado, câmeras 360º prejudicadas pela placa brasileira, maior que a europeia, e o uso de pneus Goodyear que não são run-flat, exigindo a inclusão de um enorme estepe, ainda que temporário, no porta-malas traseiro.

É uma questão de escolha, claro. Com a diferença que, aqui, só um tipo de Taycan é capaz de reescrever a história. E ele é o nosso escolhido até a hora em que surja alguém melhor — ainda que isso vá demorar alguns anos para acontecer.

Desempenho

ACELERAÇÃO
0 a 40 km/h 1,2 s
0 a 80 km/h 2,2 s
0 a 100 km/h 2,9 s
0 a 120 km/h 3,9 s
0 a 400 metros 11 s
Velocidade a 1.000 m 254,5 km/h
Vel. Real a 100 km/h 97 km/h
RETOMADA
40 a 80 km/h 1,8 s
60 a 100 km/h 1,8 s
80 a 120 km/h 2,2 s
FRENAGEM
100 km/h a 0 42,4 metros
80 km/h a 0 29,9 m
60 km/h a 0 19,2 m
CONSUMO
Urbano 188 Wh/km
Rodoviário 254 Wh/km
Autonomia em estrada 330 km

Ficha técnica

Preço R$ 1.042.201
Motores Dianteiro/Traseiro, transversal, síncrono, 723 V
Potência individual 258 cv (dianteiro) / 503 cv (traseiro)
Potência combinada 625 cv (761 cv no modo de arrancada)
Torque individual 62,3 kgfm (dianteiro) / 86,4 kgfm (traseiro)
Torque combinado 107,1 kgfm (modo de arrancada)
Câmbio Automático, somente no motor traseiro, duas marchas
Direção Elétrica, 11,2 metros
Suspensão Independente, duplo A (dianteira) e multibraço (traseira) com molas pneumáticas
Freios A disco de carbono-cerâmica ventilados e perfurados
Rodas e pneus 265/35 R21 (dianteira) e 305/30 R21 (traseira)
Comprimento 4,96 metros
Largura 1,97 metro
Altura 1,38 metro
Entre-eixos 2,90 metros
Bateria Feita pela LG Chem, 93,4 kWh (nominal) / 83,7 kWh (efetiva)
Tempo de recarga 93 min (Rápido 50 kW, 5% a 80%), 10,5 h (Wallbox 9,6 kW, 0 a 100%)
Conectores Type 2 (esquerdo), Type 2 + CCS2 (direito)
Porta-malas 84 litros (dianteira) e 366 litros (traseira, sem estepe)
Peso 2.295 kg

O continente perdido que levou 375 anos para ser descoberto

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O oitavo continente do mundo, cuja descoberta foi anunciada em 2017, sempre esteve escondido à vista de todos — mas permanece cercado de mistérios. 
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TOPO
Por BBC  
01/03/2021 21h40 Atualizado há 13 horas
Postado em 02 de março de 2021 às 11h40m


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Abel Tasman possivelmente encontrou o grande continente do sul, embora não tenha percebido que 94% dele estava debaixo d'água — Foto: Alamy/BBC
Abel Tasman possivelmente encontrou o grande continente do sul, embora não tenha percebido que 94% dele estava debaixo d'água — Foto: Alamy/BBC

O ano era 1642, e Abel Tasman estava em uma missão. O experiente marinheiro holandês, que ostentava um bigode extravagante, cavanhaque espesso e uma inclinação a fazer justiça com as próprias mãos — mais tarde, ele tentaria enforcar alguns de seus tripulantes em um desvario de embriaguez — estava confiante da existência de um vasto continente no hemisfério sul e determinado a encontrá-lo.

Na época, esta parte do globo ainda era um tanto desconhecida para os europeus, mas eles tinham uma crença inabalável de que deveria haver uma enorme massa de terra ali — preventivamente chamada de Terra Australis — para contrabalançar seu próprio continente ao norte. A hipótese datava dos tempos da Roma Antiga, mas só agora seria testada.

E assim, em 14 de agosto, Tasman zarpou da base de sua companhia em Jacarta, na Indonésia, com duas embarcações pequenas e rumou para o oeste, depois para o sul, em seguida para o leste, terminando na Ilha Sul da Nova Zelândia.

Mas seu primeiro encontro com o povo maori local não foi nada bom: no segundo dia, vários remaram em uma canoa e colidiram com um pequeno barco que transmitia mensagens entre as embarcações holandesas. Quatro europeus morreram.

Na sequência, os europeus dispararam um canhão contra 11 canoas — não se sabe o que aconteceu com seus alvos.

E esse foi o fim de sua missão — Tasman chamou o local fatídico de Moordenaers Bay ("Baía dos Assassinos"), com pouco senso de ironia, e voltou para casa várias semanas depois, sem sequer ter posto os pés na nova terra.

Embora acreditasse ter realmente descoberto o grande continente do sul, evidentemente, estava longe de ser a utopia comercial que ele havia vislumbrado. E ele não voltou mais.

(Naquela época, a Austrália já era conhecida, mas os europeus achavam que não era o lendário continente que procuravam. Mais tarde, quando mudaram de ideia, recebeu o nome de Terra Australis).

Mal sabia Tasman que ele estava certo o tempo todo. Estava faltando um continente.

Em 2017, um grupo de geólogos ganhou as manchetes dos jornais ao anunciar a descoberta da Zelândia — Te Riu-a-Māui, na língua maori. Um vasto continente de 4,9 milhões de quilômetros quadrados, cerca de seis vezes o tamanho de Madagascar.

Embora as enciclopédias, mapas e mecanismos de busca do mundo estivessem convencidos quanto à existência de apenas sete continentes, a equipe informou com segurança ao mundo que isso estava errado.

No fim das contas, são oito continentes — e o último a ser incluído na lista quebra todos os recordes, como o menor, o mais fino e o mais jovem do mundo.

A questão é que 94% dele está submerso, com apenas um punhado de ilhas, como a Nova Zelândia, emergindo de suas profundezas oceânicas. Ele ficou escondido à vista de todos o tempo todo.

"Este é um exemplo de como algo muito óbvio pode demorar um pouco para ser descoberto", diz Andy Tulloch, geólogo do instituto de pesquisa da coroa neozelandesa GNS Science, que fez parte da equipe que descobriu a Zelândia.

Mas isso é apenas o começo. Quatro anos depois, o continente segue cercado de mistério, seus segredos estão cuidadosamente guardados a 2 km embaixo d'água. Como foi formado? Quem costumava morar lá? E há quanto tempo está submerso?

Uma descoberta trabalhosa

Na verdade, a Zelândia sempre foi difícil de estudar.

Mais de um século depois que Tasman descobriu a Nova Zelândia em 1642, o cartógrafo britânico James Cook foi enviado em uma viagem científica ao hemisfério sul.

As embarcações de Tasman deixaram a Nova Zelândia após um encontro sangrento com o povo maori — mas ele acreditava ter encontrado o lendário continente do sul — Foto: Alamy/BBC
As embarcações de Tasman deixaram a Nova Zelândia após um encontro sangrento com o povo maori — mas ele acreditava ter encontrado o lendário continente do sul — Foto: Alamy/BBC

Suas instruções oficiais eram observar a passagem de Vênus entre a Terra e o Sol, a fim de calcular a que distância o Sol está.

Mas ele também carregava consigo um envelope lacrado, que foi instruído a abrir quando tivesse concluído a primeira tarefa. Dentro do envelope, havia uma missão ultrassecreta para descobrir o continente do sul — pelo qual ele provavelmente passou direto, antes de chegar à Nova Zelândia.

As primeiras pistas reais da existência da Zelândia foram reunidas pelo naturalista escocês Sir James Hector, que participou de uma viagem para pesquisar uma série de ilhas na costa sul da Nova Zelândia em 1895.

Depois de estudar sua geologia, ele concluiu que a Nova Zelândia é "o resquício de uma cadeia de montanhas que formava a crista de uma grande área continental que se estendia ao sul e a leste, e que agora está submersa ...".

Apesar dessa descoberta inicial, o reconhecimento de uma possível Zelândia permaneceu obscuro, e muito pouco aconteceu até a década de 1960. 

"As coisas acontecem muito lentamente neste campo", diz Nick Mortimer, geólogo do GNS Science que liderou o estudo de 2017.

Então, na década de 1960, os geólogos finalmente chegaram a um consenso sobre a definição do que é um continente — de modo geral, uma área geológica com uma grande elevação, grande variedade de rochas e uma crosta espessa. Também tem que ser grande.

"Não pode ser simplesmente um pedacinho", diz Mortimer.

Isso deu aos geólogos algo com que trabalhar — se eles pudessem coletar evidências, poderiam provar que o oitavo continente era real.

Ainda assim, a missão não andou — descobrir um continente é complicado e caro, e Mortimer aponta que não havia urgência.

Então, em 1995, o geofísico americano Bruce Luyendyk descreveu novamente a região como um continente e sugeriu chamá-lo de Zelândia. A partir daí, Tulloch descreve sua descoberta como uma curva exponencial.

Por volta da mesma época, a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar entrou em vigor e, finalmente, forneceu uma motivação séria.

O tratado afirma que os países podem estender seus territórios legais além de sua Zona Econômica Exclusiva, até 370 km de seus litorais, para reivindicar sua "plataforma continental estendida" — com todas as riquezas minerais e petróleo que ela abrange.

Se a Nova Zelândia pudesse provar que fazia parte de um continente maior, poderia aumentar seu território em seis vezes. De repente, surgiu uma abundância de fundos para viagens de levantamento da área, e as evidências se acumularam gradualmente.

A cada amostra de rocha coletada, o caso da Zelândia se fortalecia.

A evidência final veio de dados de satélite, que podem ser usados para rastrear pequenas variações na gravidade da Terra em diferentes partes da crosta para mapear o fundo do mar. Com esta tecnologia, a Zelândia é claramente visível como uma massa disforme quase tão grande quanto a Austrália.

Quando o continente foi finalmente revelado ao mundo, foi desvendado um dos territórios marítimos mais significativos do planeta.

"É bem legal", diz Mortimer. "Se você pensar sobre isso, cada continente do planeta tem diferentes países, [mas] existem apenas três territórios na Zelândia."

Além da Nova Zelândia, o continente abrange a ilha da Nova Caledônia — território francês famoso por suas lagoas deslumbrantes — e os minúsculos territórios australianos da Ilha de Lord Howe e da Pirâmide de Ball.

Esta última foi descrita por um explorador do século 18 como aparentando ser "não maior do que um barco".

Uma extensão misteriosa

A Zelândia era originalmente parte do antigo supercontinente de Gondwana, que foi formado há cerca de 550 milhões de anos e basicamente agrupava todas as terras do hemisfério sul.

Ele ficava num canto na parte leste, onde fazia fronteira com vários outros, incluindo metade da Antártida Ocidental e todo o leste da Austrália.

Então, há cerca de 105 milhões de anos, "devido a um processo que ainda não entendemos completamente, a Zelândia começou a se afastar", diz Tulloch.

A crosta continental tem geralmente cerca de 40 km de profundidade —significativamente mais espessa que a crosta oceânica, que tende a ter aproximadamente 10 km.

À medida que foi tensionada, a Zelândia acabou sendo tão esticada que sua crosta agora se estende apenas 20 km para baixo. Por fim, o continente fino como uma lâmina afundou — embora não exatamente ao nível da crosta oceânica normal — e desapareceu embaixo d'água.

Apesar de ser fino e submerso, os geólogos sabem que a Zelândia é um continente por causa dos tipos de rochas encontradas lá.

A crosta continental costuma ser composta de rochas ígneas, metamórficas e sedimentares — como granito, xisto e calcário, enquanto o fundo do oceano é geralmente feito apenas de rochas ígneas, como o basalto.

Mas ainda existem muitas incógnitas. As origens incomuns do oitavo continente o tornam particularmente intrigante para os geólogos.

Por exemplo, ainda não está claro como a Zelândia conseguiu ficar junta sendo tão fina e não se desintegrou em minúsculos microcontinentes.

Outro mistério é exatamente quando a Zelândia acabou submersa — e se alguma vez, de fato, consistiu de terra firme.

As partes que estão atualmente acima do nível do mar são cristas que se formaram quando as placas tectônicas do Pacífico e da Austrália se encontraram.

Tulloch diz que não há consenso em relação a se o continente esteve sempre submerso, exceto por algumas pequenas ilhas, ou se alguma vez foi composto apenas por terra firme.

Isso também levanta a questão sobre quem vivia lá.

Com seu clima ameno e 101 milhões de quilômetros quadrados, Gondwana era o lar de uma vasta variedade de flora e fauna, incluindo os primeiros animais quadrúpedes terrestres e, mais tarde, dos maiores que já existiram — os titanossauros.

Será então que as rochas da Zelândia podem estar cravejadas com seus restos mortais preservados?

Debate sobre dinossauros

Animais terrestres fossilizados são raros no hemisfério sul, mas os restos mortais de vários foram encontrados na Nova Zelândia na década de 1990, incluindo a costela de um dinossauro gigante de cauda e pescoço longos (saurópode), de um dinossauro herbívoro bicudo (hipsilofodonte) e de um dinossauro "blindado" (anquilossauro).

O pássaro-elefante tinha 3m de altura — e fragmentos da casca dos seus ovos estão espalhados pelas praias até hoje — Foto: Alamy/BBC
O pássaro-elefante tinha 3m de altura — e fragmentos da casca dos seus ovos estão espalhados pelas praias até hoje — Foto: Alamy/BBC

Em 2006, o osso da pata de um carnívoro gigante, possivelmente uma espécie de alossauro, foi descoberto nas Ilhas Chatham, a cerca de 800 km a leste da Ilha Sul. Essencialmente, todos os fósseis datam de depois que o continente da Zelândia se separou de Gondwana.

No entanto, isso não significa necessariamente que havia dinossauros perambulando pela maior parte da Zelândia — essas ilhas podem ter sido santuários, enquanto o resto estava submerso, como agora.

"Há um longo debate sobre isso, se é possível ter animais terrestres sem terra contínua — e se, sem isso, eles teriam sido extintos", diz Sutherland.

A trama se complica ainda mais com um dos mais estranhos e amados habitantes da Nova Zelândia, o kiwi — um pássaro atarracado e incapaz de voar com uma espécie de bigode e penas semelhantes a cabelos.

Curiosamente, acredita-se que seu parente mais próximo não seja o moa, que faz parte do mesmo grupo de aves — as ratites — e viveu na mesma ilha até sua extinção há 500 anos, mas sim o ainda mais colossal pássaro-elefante, que espreitava as florestas de Madagascar até 800 anos atrás.

A descoberta levou os cientistas a acreditar que ambas as aves evoluíram de um ancestral comum que vivia em Gondwana.

Demorou 130 milhões de anos para ele se separar totalmente, mas quando isso aconteceu, deixou para trás fragmentos que já foram espalhados por todo o globo, formando a América do Sul, África, Madagascar, Antártida, Austrália, Península Arábica, o Subcontinente Indiano e Zelândia.

Isso sugere, por sua vez, que pelo menos parte da agora submersa Zelândia permaneceu acima do nível do mar o tempo todo.

Exceto por volta de 25 milhões de anos atrás, acredita-se que todo o continente — possivelmente até mesmo toda a Nova Zelândia — estivesse debaixo d'água.

"Pensava-se que todas as plantas e animais haviam colonizado depois", diz Sutherland.

Mas então o que aconteceu?

Embora não seja possível coletar fósseis diretamente do fundo do mar da Zelândia, os cientistas estão prospectando suas profundezas com perfurações.

"Na verdade, os fósseis mais úteis e distintivos são aqueles que se formam em mares muito rasos", diz Sutherland.

"Porque eles deixam um registro — existem zilhões e zilhões de fósseis minúsculos, bem minúsculos, que são bastante distintivos."

Em 2017, uma equipe realizou os levantamentos mais extensos da região feitos até agora e perfurou mais de 1.250 m no fundo do mar em seis locais diferentes

Os núcleos que coletaram continham pólen de plantas terrestres, assim como esporos e conchas de organismos que viviam em mares rasos e quentes.

"Se você tem água, 10 metros de profundidade ou algo assim, então há uma boa chance de que houvesse terra ao redor também", diz Sutherland, explicando que o pólen e os esporos também indicam a possibilidade de que Zelândia não estivesse tão submersa quanto se pensava.

Uma torção (literal)

Outro mistério remanescente diz respeito à forma da Zelândia.

"Se você olhar um mapa geológico da Nova Zelândia, há duas coisas que realmente se destacam", diz Sutherland. Uma delas é a Falha Alpina, no limite da placa que percorre a Ilha Sul — e é tão significativa que pode ser vista do espaço.

A segunda é que a geologia da Nova Zelândia — assim como a do continente mais amplo — é estranhamente curvada. Ambos são divididos em dois por uma linha horizontal, que é onde as placas tectônicas do Pacífico e da Austrália se encontram.

Neste ponto exato, parece que alguém pegou a metade inferior e retorceu, de modo que não apenas as faixas de rocha anteriormente contínuas não estão mais alinhadas, mas estão praticamente em ângulos retos.

Uma explicação fácil para isso é que as placas tectônicas se moveram e de alguma maneira deformaram seu formato. Mas exatamente como ou quando isso aconteceu ainda está totalmente em aberto.

"Há várias interpretações, mas isso é uma grande incógnita", diz Tulloch.

Sutherland explica que é improvável que o continente revele todos os seus segredos num futuro próximo.

"É muito difícil fazer descobertas quando tudo está a 2 km debaixo d'água, e as camadas que você precisa analisar também estão a 500m abaixo do leito oceânico", diz ele.

"É realmente desafiador sair e explorar um continente como esse. Então, é preciso muito tempo, dinheiro e esforço para embarcar e pesquisar as regiões."

No mínimo, o oitavo continente do mundo certamente nos mostra que — quase 400 anos após a busca de Tasman — ainda há muito a ser descoberto.

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