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segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Brasil tem uma das piores taxas de mortes por milhão pela Covid; especialistas dizem que comparação em meio à pandemia, porém, não é a ideal

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Governo diz que país tem um dos menores índices, mas em um mês e meio o Brasil passou do 17º pior índice para o 11º entre 167 nações. Especialistas afirmam que comparações que consideram a população são importantes para estudar a evolução e a distribuição da doença, mas que, durante a pandemia, vários fatores precisam ser levados em conta ao fazer tal cálculo, como o estágio da doença, o tamanho e o perfil etário da população, o nível de testagem, entre outros.  
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Por Felipe Grandin, Laís Modelli, Carolina Dantas e Thiago Reis, G1  
10/08/2020 20h16 Atualizado há 2 horas
Postado em 10 de agosto de 2020 às 22h20m

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Brasil piora no número de mortes pela Covid-19 por milhão de habitantes Brasil piora no número de mortes pela Covid-19 por milhão de habitantes


O Brasil atingiu no último sábado (8) a marca de 100 mil mortos pela Covid-19. Apesar disso, o governo tem argumentado que o país tem um dos menores índices de óbitos por milhão entre as grandes nações. A afirmação não é verdadeira. A taxa do Brasil está entre as piores do mundo e, como as mortes continuam em ritmo alto, o Brasil está piorando nesse ranking.

Ainda assim, especialistas dizem que é preciso cuidado ao comparar a taxa de mortes por milhão de cada país. Epidemiologistas afirmam que, ao fazer simplesmente uma taxa por milhão de habitantes e comparar países, são deixadas de lado informações importantes como: o estágio da pandemia, o tamanho da população, a densidade demográfica, o perfil etário, o nível de testagem, entre outras.

Em números absolutos, o Brasil tem o segundo maior número de mortes do planeta, atrás apenas dos EUA. Já dados coletados pela universidade Johns Hopkins colocam o Brasil hoje na 11ª posição entre 167 países do mundo em taxa de mortos por milhão. Ou seja, o índice não é um dos menores entre as grandes nações. Em 20 de junho, quando o país registrou 50 mil mortos, ele figurava na 17ª colocação. Em 9 de maio, quando tinha 10 mil mortos, estava na 33ª posição.

Isso se explica, em parte, porque a doença já está sob controle em boa parte dos países da lista. Não é o caso do Brasil, cuja média móvel tem ficado em torno de mil mortes por dia, num patamar de estabilidade.

Dos países mais populosos do mundo, apenas os EUA aparecem atualmente na frente, em 10º. O Brasil também é superado por sete países da Europa (San Marino, Bélgica, Reino Unido, Andorra, Espanha, Itália e Suécia), além de Peru e Chile.

A distorção, porém, pode ser vista já na 1ª posição desse ranking: San Marino, com pouco mais de 30 mil habitantes, é o que tem mais mortes por milhão. Mas foram apenas 42 no total. O mesmo acontece com Andorra, que aparece em 4º. Há, no entanto, pouco mais de 75 mil habitantes no pequeno país europeu.
Brasil figura na 11ª posição do ranking; especialistas dizem que é preciso cuidado ao comparar taxas — Foto: Juliane Souza/G1Brasil figura na 11ª posição do ranking; especialistas dizem que é preciso cuidado ao comparar taxas — Foto: Juliane Souza/G1


Brasil é um dos países com mais mortes por dia — Foto: Juliane Souza/G1
Brasil é um dos países com mais mortes por dia — Foto: Juliane Souza/G1
Não tem como comparar número de mortes por milhão do Brasil com San Marino, por exemplo, que é o primeiro dessa lista bruta. San Marino está há muito mais tempo na pandemia e já está com os casos sob controle [não registra óbitos há dias]. Já o Brasil vem registrando cerca de mil mortes diárias tem semanas. Se olharmos somente esse número bruto, sem considerar o estágio da pandemia, entenderemos que é só uma questão de tempo para que o Brasil seja o país com maior número de mortes por milhão, diz Domingos Alves, pesquisador da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo de Ribeirão Preto.

O epidemiologista e professor da Faculdade de Medicina da USP Paulo Lotufo diz que "morte por milhão" éum termo canhestro para um coeficiente de mortalidade (costumeiramente por 100 mil habitantes) e que não se aplica em epidemias de uma forma geral. Como não se aplica numa explosão como a de Beirute, na tragédia de Brumadinho ou numa queda de avião, afirma.

Podemos usar para comparar somente locais onde já houve a epidemia, mas não para comparar local que ficou fora da pandemia (se fizermos isso, estamos inflando artificialmente o denominador), diz, referindo-se a cidades ainda não afetadas pela doença em um país continental como o Brasil.

Ainda não estamos liderando o ranking de mortes por milhão neste momento, neste estágio em que estamos da pandemia, mas certamente vamos liderar se os números não baixarem. É só comparar os registros do Brasil semana a semana com países que lideram o ranking, e veremos que temos muito mais casos e mortes, afirma o epidemiologista e reitor da Universidade Federal de Pelotas, Pedro Hallal.

Ou seja, comparações que consideram a população são importantes e são usadas para estudar a evolução e a distribuição da doença, mas fazer esse tipo de cálculo agora não é adequado, dizem os especialistas.

Estágio da pandemia

Um dos principais problemas na comparação é o estágio da pandemia em cada um dos países, afirmam os especialistas. Hallal explica que não se pode comparar a taxa de mortes de coronavírus por milhão quando se desconsidera os estágios da doença.

Quando as autoridades brasileiras divulgam que o Brasil não é um dos primeiros em um ranking de mortes por milhão, elas estão, na verdade, esquecendo que a pandemia chegou aqui mais de um mês depois da Ásia e da Europa. Nossos casos são altíssimos para nosso estágio da pandemia, afirma.

O estágio não pode ser desconsiderado nem mesmo dentro de um país. No caso do Brasil, estados de regiões como a Sudeste e a Nordeste foram afetados muito antes que os do Centro-Oeste, por exemplo.

Houve temporalidade distinta no território nacional. É o mesmo que ver a tabela do Campeonato Brasileiro às 17h do domingo. Já houve jogo no sábado e durante a manhã, mas tem jogo no meio tempo. Terá ainda o jogo da noite. E o da segunda feira, compara Lotufo.

A partir dos dados coletados pelo consórcio de veículos de imprensa, é possível ver que há estados onde a situação é bem mais grave no país. No Ceará, a taxa de mortes por milhão chega a 868. Ou seja, se o Ceará fosse um país, estaria atrás apenas de San Marino no ranking de países.

Há outros 15 estados com mortes por milhão piores que a média nacional (479), caso de Rio de Janeiro, Amazonas e Pernambuco, que figurariam em 3º lugar no mundo caso fossem países.
15 estados têm taxa de mortes por milhão maior que a média nacional — Foto: Juliane Souza/G115 estados têm taxa de mortes por milhão maior que a média nacional — Foto: Juliane Souza/G1
Mortes por dia nos estados — Foto: Juliane Souza/G1
Mortes por dia nos estados — Foto: Juliane Souza/G1
Nos EUA, não é diferente. O estado de Nova York, por exemplo, tem 1.669 mortes por milhão – o que o colocaria em primeiro disparado entre todos os países. Nova Jersey tem 1.780 mortes por milhão de habitantes.

Em compensação, há estados com menos de 100 mortes por milhão, caso do Maine, Oregon e Alaska.
Mortes por milhão de habitantes nos estados americanos — Foto: Juliane Souza/G1Mortes por milhão de habitantes nos estados americanos — Foto: Juliane Souza/G1
Perfil etário da população

Epidemiologistas ressaltam que a idade também é um fator importante e que não pode ser desprezado.

Comparações implicam em ajustamento pela pirâmide populacional A Itália tem muito mais idosos que o Brasil, por isso a taxa bruta pode ser maior, mas quando acertamos por idade, a diferença se reduz ou mesmo pode se inverter. No Brasil, Manaus é bem mais jovem que São Paulo, por isso as taxas são ainda maiores do que em SP, diz Lotufo.

Hallal concorda: Países europeus que aparecem nas primeiras posições desse ranking, como Itália e Bélgica, são nações com uma população envelhecida. É uma pirâmide etária muito diferente da do Brasil, um país com uma população muito mais jovem. Era de se esperar que o coronavírus fizesse muito mais vítimas em países com mais idosos. E mais uma vez ressalto: esses países estão há muito mais tempo na pandemia do que o Brasil.

Maria Amelia Veras, epidemiologista da Faculdade de Medicina do Hospital Santa Casa de São Paulo, diz que, em todas as comparações de uma doença que tem como um dos fatores de risco a idade, é preciso ter cuidado se as populações possuem a mesma estrutura etária. Senão, é óbvio que um país com uma população mais velha terá mais óbitos ou casos do que os que possuem uma população mais jovem. Para isso, é necessário utilizar técnicas estatísticas que padronizam as populações.

Quando analisamos diferentes países e sabemos os fatores de risco para óbito, por exemplo, sempre devemos prestar atenção na distribuição desses fatores de risco nas populações.

Densidade demográfica

O epidemiologista da UFPel ainda ressalta a questão das diferentes densidades demográficas de cada país. O fato de o Brasil ter números altos nesta pandemia também está relacionado com teremos uma das maiores populações. Mas quando olhamos a densidade demográfica e consideramos as mortes por milhão, os números podem não parecer tão altos quanto em países minúsculos como a Bélgica, em que as mortes por milhão são maiores. Isso não quer dizer que eles estão piores que a gente, afirma Hallal.

Testes e subnotificação

Outro fator que pode interferir no cálculo é o nível de testagem. Em países em que há exames sendo feitos em massa e onde os resultados são divulgados com rapidez, a probabilidade é que os dados retratem de forma muito fiel a pandemia.

Não conhecemos a totalidade de casos e óbitos no Brasil, já que não dispomos de testes em quantidade e qualidade adequados (por exemplo, temos pouco RT-PCR). Também sabemos que há cidades que não puderam testar grupos grandes de pessoas que foram a óbito, diz Maria Amélia Veras.

Segundo nossas estatísticas, os boletins do Ministério da Saúde refletem apenas 60% dos óbitos de coronavírus no país. Ou seja, 40% ficam subnotificados, conclui Domingos Alves.

Para Antonio Silva Lima Neto, epidemiologista e pós-doutor pela Universidade de Harvard, "o indicador de mortes por milhão é utilizado como desfecho". "Ao final de um processo você calcula o número de mortes por milhão e aí você pode fazer um debate sobre o que aconteceu. Enfim, é uma taxa importante, mas normalmente utilizada como uma taxa de desfecho."

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'Leve, cremosa e palatável': as 'iguarias' do festival de vespas do Japão

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Por gerações, famílias japonesas caçaram, criaram e comeram vespas, mas esse costume corre o risco de desaparecer em breve. 
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Por BBC  
09/08/2020 19h18 Atualizado há 14 horas
Postado em 10 de agosto de 2020 às 09h00m

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Após seguirem as vespas, os caçadores apanham o ninho e ‘criam’ as larvas até o festival — Foto: Phoebe Amoroso/BBCApós seguirem as vespas, os caçadores apanham o ninho e ‘criam’ as larvas até o festival — Foto: Phoebe Amoroso/BBC

"Tenho uma coisa para você." Um dos caçadores de vespas da vila me chamou até uma pequena tenda. E desembrulhou na minha frente um pedaço de ninho de vespa repleto de larvas.

Ele estava me oferecendo uma iguaria rara, disponível apenas uma vez por ano, em novembro. Um quilo do ninho é vendido por 9 mil ienes (cerca de R$ 440). Eu coloquei uma larva ainda se contorcendo na boca e engoli (rapidamente).

Era leve, cremosa e perfeitamente palatável. O caçador de vespas e eu continuamos a conversar, enquanto comíamos as larvas como petisco. Estávamos no interior da província de Gifu, no maior festival de vespas do Japão: o Kushihara Hebo Matsuri. Hebo é a palavra local para se referir a duas espécies de vespas negras, conhecidas por não serem agressivas e, portanto, fáceis de capturar.
‘Vespas assassinas’ asiáticas são encontradas pela primeira vez nos EUA
‘Vespas assassinas’ asiáticas são encontradas pela primeira vez nos EUA

Todos os anos, no primeiro domingo de novembro, pessoas de toda a região levam os ninhos de vespas que foram apanhados nas florestas vizinhas para serem pesados em uma competição na qual o dono do ninho mais pesado leva para casa um troféu. A maioria dos participantes recebe uma ou duas picadas, e alguns compram ninhos de vespa para cozinhar em casa.
As larvas de vespas são uma iguaria altamente valorizada há gerações no Japão — Foto: Phoebe Amoroso/BBCAs larvas de vespas são uma iguaria altamente valorizada há gerações no Japão — Foto: Phoebe Amoroso/BBC

O festival, no entanto, é apenas o fim de uma história que começa alguns meses antes. No início do verão, é aberta a temporada de caça às vespas nas colinas. Nas profundezas da floresta, os caçadores prendem um pedaço de papel branco (para atrair a atenção das vespas) em uma porção de peixe fresco e aguardam.

Logo, uma vespa aparece, mordendo a isca. E os caçadores a perseguem enquanto ela voa em direção ao seu ninho, atravessando arbustos, riachos e vales.

Quando finalmente localizam a entrada para o ninho da vespa no solo, eles o desenterram e transferem para uma caixa de madeira, onde continuam a "criar" as vespas até o outono. Os caçadores alimentam os insetos com uma dieta à base de açúcar, água e carne crua, na tentativa de cultivar um ninho repleto de vespas adultas e larvas a tempo do festival.

O consumo de vespas costumava ser difundido em todo o Japão. No entanto, este hábito está morrendo, ficando restrito principalmente à geração cada vez menor de idosos de Ena, na província de Gifu, onde está localizada a vila Kushihara, e de Nakatsugawa, a nordeste.

De acordo com Kenichi Nonaka, professor de Estudos Culturais Interdisciplinares da Universidade Rikkyo, em Tóquio, que estuda a região há mais de 30 anos, as origens dessa tradição gastronômica única são um mistério.

Algumas teorias sugerem que as vespas já foram uma fonte valiosa de proteína para essa comunidade do interior, mas Nonaka discorda: "100g de vespas negras contêm relativamente um alto teor de proteínas, mas, na realidade, ninguém come essa quantidade de uma vez".

Depois de pesquisar outros lugares no Japão onde comer vespas negras era comum, Nonaka descobriu que os insetos normalmente só eram apanhados quando as pessoas os encontravam por acaso — e eram consumidos apenas como fonte suplementar de alimentos. Basicamente, apanhar vespas negras era a versão com insetos da colheita de amora.

Mas, segundo Nonaka, o que torna Kushihara e as regiões vizinhas únicas é que, enquanto indivíduos em outras áreas do Japão apanhavam os ninhos sozinhos, a população local procurava ativamente por vespas como uma atividade social e posteriormente as criavam fora de suas casas.

Como resultado, as vespas negras eram frequentemente servidas durante as celebrações locais, tornando a prática de caça às vespas profundamente enraizada na cultura e identidade regional.

Dada a importância comunitária das vespas para Kushihara, talvez não surpreenda que um grande festival popular tenha sido criado em 1993, quando a geração mais velha de caçadores de vespas diminuiu, a fim de salvar a tradição. E, enquanto outras regiões realizam competições menores de vespas, Kushihara foi a única a receber uma cobertura significativa da imprensa, o que ajudou a consolidar sua reputação.

No entanto, a cidade de Ena sofre com muitos dos problemas que afetam o Japão a nível nacional. A população em declínio e o êxodo rural deixaram as ruas vazias e casas abandonadas.

Kushihara deixou de ser um município independente, sendo incorporado à cidade de Ena, à medida que a população local diminuiu (a população de Ena caiu aproximadamente 12% entre 2000 e 2015, somando 51.073 habitantes).

Em 2010, os organizadores idosos do festival começaram a falar em acabar com o evento, até que alguns moradores mais jovens se dispuseram a levar adiante a tradição. "Enquanto existir uma pessoa viva que ame vespa, teremos motivação suficiente para manter a tradição", afirma Daisuke Miyake, de 42 anos, guarda florestal local. "Hebo é uma maneira de conectar as pessoas."
Enquanto em outras partes do Japão as pessoas apanham ninhos sozinhas, para os moradores da vila Kushihara, caçar vespas é uma atividade social — Foto: Phoebe Amoroso/BBCEnquanto em outras partes do Japão as pessoas apanham ninhos sozinhas, para os moradores da vila Kushihara, caçar vespas é uma atividade social — Foto: Phoebe Amoroso/BBC

Seis anos atrás, Miyake e outros jovens da cidade assumiram a direção do festival. Embora poucos deles tenham o hábito de apanhar e criar vespas, eles compreendem o quanto esses insetos significam para as gerações mais velha.

Às 7h30 do dia do festival, Miyake já estava a todo vapor, subindo em uma árvore para ajudar a pendurar um cartaz. Enquanto isso, me aproximei dos únicos não-organizadores por perto.

Quatro idosos levaram seus banquinhos e aguardaram sentados pacientemente no meio do gramado. O festival só começaria em mais ou menos uma hora, mas eles estavam ansiosos para serem os primeiros da fila e, assim, conseguir escolher os melhores ninhos à venda.

Uma vez que eles garantiram sua vaga, fomos juntos às barracas do festival, que apresentavam uma variedade de pratos à base de vespa. Estava de olho nos espetinhos de vespa com chocolate, quando um dos meus novos companheiros apareceu com um pote de vespas fritas.

Como alguns outros anciãos de Kushihara, eles caçam vespa mandarinia japonica (as vespas gigantes japonesas), conhecidas pela agressividade e poder do ferrão. Não são insetos que você cria em casa.

"Você come vespas, certo?", perguntou um deles, em tom desafiador.
"Vai em frente! Escolhe uma grande!, emendou outro.

O grupo caiu na gargalhada. Peguei uma de tamanho médio com o palitinho e mastiguei cuidadosamente. Era levemente crocante e, devo admitir, bastante apetitosa. Exatamente o tipo de petisco que cairia bem com uma cerveja. Um deles já estava sentado em seu banquinho com uma bebida na mão e um sorriso no rosto.

Logo, estávamos devorando um dos pratos mais populares do festival, o hebo gohei mochi: arroz grudento grelhado em um palito revestido com um molho grosso e doce feito de missô, amendoim e, é claro, vespas. É um prato que exige que você soque o arroz e amasse as larvas de hebo.

Demora horas para ser preparado, mas é servido em ocasiões comemorativas há séculos na região. Uma longa fila dava voltas em direção ao balcão, onde uma equipe cobria habilmente o mochi com o molho e grelhava na sequência, em uma linha de produção bastante afinada.

Um grupo de mulheres mais jovens usando camisetas escrito "Garotas Hebo" vendia hebo gohan, um prato de arroz misturado com vespas. Elas decidiram tomar a frente neste ano depois que várias mulheres idosas da vila se aposentaram do preparo de alimentos para o festival. Estavam acordadas desde as 4h para cozinhar centenas de porções de arroz, e haviam preparado hebo gohei mochi no dia anterior também.

"Eu como hebo desde criança, era uma comida comum. Mas, desde que comecei a fazer gohei mochi, quero compartilhar essa cultura com todos, diz Shoko Miyake, esposa de Daisuke.

Nos últimos anos, houve um interesse crescente pela entomofagia (consumo de insetos por seres humanos), tanto no Japão quanto internacionalmente, o que tem levado um número maior de visitantes ao festival. Não só uma oportunidade para a revitalização econômica da região, como também uma chance para a população local se reconectar com seu patrimônio cultural.

No entanto, ainda existe uma preocupação se as gerações mais novas vão adotar a tradição de caça a vespas como seus pais ou avós. Enquanto muitos ficam felizes em ajudar no festival, alguns não gostam muito de comer vespa, quanto mais de criá-las.

A questão mais premente é quem vai passar adiante as técnicas de caça. Muitos moradores mais jovens ainda precisam aprender, mas demonstram pouco entusiasmo. E à medida que mais gente sai da região de Kushihara em busca de trabalho, sobra pouco tempo para cultivar um hobby tão específico.

Ciente do problema, o chefe do comitê executivo do festival, Fumitaka Ando, está organizando uma missão de caça, em julho deste ano, para um pequeno grupo de moradores, incluindo as Garotas Hebo. Ele mesmo só começou a caçar vespas há três anos. E acredita que a recente popularidade do festival é um incentivo.

O número de jovens voluntários aumentou, e, nesse ano, tivemos as meninas. Kushihara se tornou uma equipe.

Depois do festival, fui parar na casa de Daisuke e Shoko, sentada em volta da mesa de jantar com as três filhas do casal. Shoko estava no fogão, cozinhando as vespas com um molho shoyo doce, para fazer uma cobertura para o arroz que tinha acabado de preparar. Algo que ela costumava fazer com os pais na infância. Continuamos a conversar casualmente enquanto devorávamos o ninho de vespa, e as crianças observavam com o semblante franzido.

No fim das contas, a cultura hebo é tanto sobre família, amigos e identidade local, quanto sobre comer insetos.

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