San Francisco – O presidente Joe Biden e muitos legisladores em
Washington estão preocupados atualmente com os chips de computador e as
ambições da China em relação a essa tecnologia fundamental.

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Máquina de fabricação de chips na instalação de pesquisa da IBM em
Albany, Nova York, 30 de junho de 2021. (Bryan Derballa/The New York
Times)
Mas uma máquina imensa vendida por uma empresa holandesa surgiu como
um auxílio estratégico fundamental para os formuladores de políticas – e
mostra como são irrealistas as esperanças de qualquer país de construir
uma cadeia de suprimentos completamente autossuficiente em tecnologia
de semicondutores.
A máquina é fabricada pela ASML Holding,
sediada em Veldhoven. Seu sistema usa um tipo diferente de luz para
produzir circuitos ultrapequenos nos chips, aumentando o desempenho das
pequenas fatias de silício. A ferramenta, que levou décadas para ser
desenvolvida e foi introduzida para fábricas com alto volume de produção
em 2017, custa mais de US$ 150 milhões. O envio aos clientes requer 40
contêineres de transporte, 20 caminhões e três Boeings 747.
A
máquina complexa é amplamente reconhecida como necessária para fazer os
chips mais avançados, habilidade com implicações geopolíticas. O governo
Trump pressionou com sucesso o governo holandês a bloquear seu envio
para a China em 2019, e o governo Biden não mostrou sinais de reverter
essa postura.
Os fabricantes não podem produzir chips de ponta
sem esse sistema, e "ele só é feito pela empresa holandesa ASML",
afirmou Will Hunt, analista de pesquisa do Centro de Segurança e
Tecnologia Emergente da Universidade de Georgetown, que concluiu que os
chineses levariam pelo menos uma década para construir equipamento
semelhante. "Do ponto de vista da China, isso é frustrante."
A
máquina da ASML se tornou efetivamente um gargalo na cadeia de
suprimentos para chips, que são o cérebro de computadores e outros
dispositivos digitais. O desenvolvimento e a produção da ferramenta em
três continentes – usando expertise e peças do Japão, dos Estados Unidos
e da Alemanha – também é um lembrete de que essa cadeia de suprimentos é
global, mostrando a dificuldade para qualquer país que queira avançar
sozinho na produção de semicondutores.

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O engenheiro de equipamentos Robert Young segura um wafer de silício de
uma máquina de fabricação de chips na instalação de pesquisa da IBM em
Albany, Nova York, 30 de junho de 2021. (Bryan Derballa/The New York
Times)
Isso inclui não só a China, mas também os Estados Unidos, onde o
Congresso está debatendo planos de gastar mais de US$ 50 bilhões para
reduzir a dependência de fabricantes de chips estrangeiros. Muitas áreas
do governo federal, particularmente o Pentágono, estão preocupadas com a
dependência americana do principal fabricante de chips de Taiwan e com a
proximidade da ilha com a China.
Criada em 1984 pela gigante
eletrônica Philips e outra fabricante de ferramentas, a ASML, Advanced
Semiconductor Materials International, tornou-se uma empresa
independente e, de longe, a maior fornecedora de equipamentos de
fabricação de chips envolvendo um processo chamado litografia.
Com
a litografia, os fabricantes projetam repetidamente padrões de
circuitos de chips em pastilhas de silício. Quanto mais transistores
minúsculos e outros componentes podem ser adicionados a um chip
individual, mais poderoso ele se torna e aumenta sua capacidade de
armazenar dados. O ritmo dessa miniaturização é conhecido como Lei de
Moore, em homenagem a Gordon Moore, um dos cofundadores da gigante de
chips Intel.
Em 1997, a ASML começou a estudar a adoção da luz
ultravioleta extrema (ou EUV, na sigla em inglês). Essa luz tem
comprimentos de onda ultrapequenos que podem criar circuitos muito
menores do que é possível com a litografia convencional. Mais tarde, a
empresa decidiu fazer máquinas baseadas na tecnologia, esforço que
custou US$ 8 bilhões desde o fim dos anos 1990.
O processo de
desenvolvimento rapidamente se tornou global. A ASML agora monta as
máquinas usando espelhos da Alemanha e hardware desenvolvido em San
Diego, que gera luz explodindo gotículas de estanho com um laser. Os
principais produtos químicos e componentes vêm do Japão.
O
executivo-chefe da ASML, Peter Wennink, disse que a falta de dinheiro
nos primeiros anos da empresa o levou a integrar invenções de
fornecedores especializados, criando o que chama de "rede de
conhecimento colaborativo" que inova rapidamente. "Fomos forçados a não
fazer o que os outros fazem melhor."
A ASML lançou mão de outra
cooperação internacional. No início da década de 1980, pesquisadores dos
Estados Unidos, do Japão e da Europa começaram a considerar a mudança
radical nas fontes de luz. O conceito foi retomado por um consórcio que
incluía a Intel e outros dois fabricantes de chips dos EUA, bem como
laboratórios do Departamento de Energia.
A ASML aderiu em 1999
depois de mais de um ano de negociações, de acordo com Martin van den
Brink, presidente e diretor de tecnologia da empresa. Outros parceiros
eram o Centro de Pesquisa Imec na Bélgica e outro consórcio americano, a
Sematech. Mais tarde, a ASML atraiu grandes investimentos da Intel, da
Samsung Electronics e da Taiwan Semiconductor Manufacturing Company para
ajudar a financiar o desenvolvimento.
Esse desenvolvimento foi
dificultado pelas peculiaridades da luz EUV. Máquinas de litografia
geralmente concentram a luz através de lentes para projetar padrões de
circuito em pastilhas; mas os pequenos comprimentos de onda EUV são
absorvidos pelo vidro, por isso as lentes não funcionam. Os espelhos,
outra ferramenta comum para direcionar a luz, têm o mesmo problema. Isso
significava que a nova litografia exigia espelhos com revestimentos
complexos que, combinados, refletissem melhor os pequenos comprimentos
de onda.
Assim, a ASML recorreu à Zeiss Group, empresa óptica
alemã com 175 anos de existência e parceira de longa data. Suas
contribuições incluíram um sistema de projeção de 1,8 tonelada para
lidar com a luz EUV, que conta com seis espelhos especialmente moldados
que são moídos, polidos e revestidos ao longo de vários meses em um
processo robótico elaborado que usa feixes de íons para remover
defeitos.
A geração de luz suficiente para projetar imagens
rapidamente também causou atrasos, segundo Van den Brink. Mas a Cymer,
empresa de San Diego que a ASML comprou em 2013, acabou melhorando um
sistema que direciona pulsos de um laser de alta potência para atingir
gotículas de estanho 50 mil vezes por segundo – uma vez para achatá-los e
uma segunda vez para vaporizá-los –, criando luz intensa.
O novo
sistema também exigiu componentes redesenhados chamados fotomáscaras,
que agem como estêncil em projetos de circuitos de projeção, além de
novos produtos químicos depositados em pastilhas que geram essas imagens
quando expostos à luz. Empresas japonesas agora fornecem a maioria
desses produtos.
Desde que a ASML introduziu seu modelo comercial
de EUV em 2017, os clientes compraram cerca de cem deles. Os
compradores incluem a Samsung e a TSMC, o maior serviço de produção de
chips projetados por outras empresas. A TSMC usa a ferramenta para fazer
os processadores projetados pela Apple para seus iPhones mais recentes.
A Intel e a IBM declararam que o EUV é crucial para seus planos. "É
definitivamente a máquina mais complicada que os humanos construíram",
afirmou Darío Gil, vice-presidente sênior da IBM.
As restrições
holandesas à exportação dessas máquinas para a China, adotadas desde
2019, não tiveram muito impacto financeiro na ASML, uma vez que há um
atraso nos pedidos de outros países. Mas cerca de 15 por cento das
vendas da empresa provêm da venda de sistemas mais antigos na China.
Em
um relatório final ao Congresso e a Biden em março, a Comissão de
Segurança Nacional de Inteligência Artificial propôs estender os
controles de exportação para algumas outras máquinas avançadas da ASML. O
grupo, financiado pelo Congresso, busca limitar os avanços da
inteligência artificial com aplicações militares.
Hunt e outros
especialistas em política argumentaram que, como a China já estava
usando essas máquinas, bloquear vendas adicionais prejudicaria a ASML
sem muito benefício estratégico. A empresa concorda. "Espero que o bom
senso prevaleça", disse Van den Brink.
c. 2021 The New York Times Company