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terça-feira, 6 de abril de 2021

Acadêmica brasileira viraliza unindo kimono e cabelo afro no Japão

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Depois de crescer em uma favela paulistana, Marina de Melo do Nascimento concluiu o mestrado em uma das mais antigas e prestigiadas faculdades do Japão.
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TOPO
Por BBC

Postado em 06 de abril de 2021 às 19h25m


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Me formando de kimono e afro": foto de Mari Melo viralizou no Instagram e no Facebook — Foto: Marina Melo/Arquivo pessoal
Me formando de kimono e afro": foto de Mari Melo viralizou no Instagram e no Facebook — Foto: Marina Melo/Arquivo pessoal

"De Itaquera pra atual universidade número um do Japão! Me formando de kimono e afro", escreveu a jovem acadêmica Mari Melo, de 29 anos, na noite de 25 de março. Na manhã seguinte, ela despertou com milhares de notificações no Twitter e Instagram. No Facebook, sua foto foi compartilhada por diversas páginas e viralizou.

"Quem é essa gente toda aqui?", brincou ela, surpresa com a repercussão. Surpresa, mas feliz.

Marina de Melo do Nascimento concluiu o mestrado na Universidade de Tohoku, uma das mais antigas e prestigiadas do Japão. Foi a oportunidade que teve de vestir o "hakama", um traje tradicional japonês utilizado para cerimônias especiais. Ao modelo com saia de pregas pink e mangas num tom de lilás, a acadêmica adicionou flores amarelas para adornar o cabelo afro.

O hakama foi feito para facilitar o movimento, permitindo pular e fugir dos inimigos e utilizar a espada.

"As primeiras estudantes japonesas emprestaram dos seus irmãos a vestimenta para que pudessem frequentar a escola da mesma maneira que eles, de forma livre", ela contextualizou, no Twitter. "O hakama é uma conquista feminina, que celebra a possibilidade de movimentar o corpo, estudar e se colocar em pé de igualdade aos homens."

Paulistana, Marina nasceu e cresceu em Itaquera, na zona leste de São Paulo, até os 15 anos. Morou em uma casa simples em uma favela, ao lado de um lixão. Depois, mudou-se para o distrito da Vila Carrão, também na zona leste da cidade. Foi ali que ela passou a se interessar por língua japonesa.

Nos arredores onde a família de Marina vivia na Vila Carrão, viviam muitos imigrantes e descendentes de Okinawa, a menor e mais meridional ilha do arquipélago japonês. À época adolescente, ela cultivou interesse por desenhos e quadrinhos nipônicos como uma válvula de escape para a realidade paulistana periférica que vivia.

"Era divertido e me distraía do dia a dia", diz à BBC News Brasil.

Mari Melo cresceu em uma casa simples em uma favela ao lado de um lixão em Itaquera — Foto: Arquivo pessoal
Mari Melo cresceu em uma casa simples em uma favela ao lado de um lixão em Itaquera — Foto: Arquivo pessoal

Graças a uma bolsa de estudos por desempenho, ela estudou em um colégio particular. À parte, estudava inglês por conta própria e, a certo ponto, decidiu procurar um curso de japonês. Na capital paulista, que abriga a maior colônia japonesa do mundo fora do Japão, com cerca de 325 mil pessoas segundo os últimos dados disponíveis, ela encontrou apenas um curso na zona leste. Aos 17 anos, tentou se inscrever.

Mari Melo, historiadora paulistana de Itaquera, se formou na Universidade de Tohoku, uma das mais antigas e prestigiadas do Japão — Foto: Arquivo pessoal
Mari Melo, historiadora paulistana de Itaquera, se formou na Universidade de Tohoku, uma das mais antigas e prestigiadas do Japão — Foto: Arquivo pessoal

"Fui fazer a matrícula e me perguntaram: 'Ah, você é descendente?' Não, respondi. E eles disseram: 'Ah, mas então por que você quer estudar japonês? Infelizmente, não vai ter vaga para você, não. Melhor dar a vaga para alguém que vai aprender e usar a língua japonesa, você não vai'. Saí chorando de lá", lembra ela, visivelmente emocionada.

De Itaquera para a USP

Em 2010, a estudante passou no vestibular para o curso de letras na Universidade de São Paulo (USP). Na hora de escolher a língua na qual gostaria de se especializar, não teve dúvidas: japonês. "Pela primeira vez, ninguém me questionou 'por que japonês?' Foi um momento incrível", conta.

Marina conta que nunca passou situação crítica ou constrangedora por ser negra e estrangeira no Japão — Foto: Arquivo pessoal
Marina conta que nunca passou situação crítica ou constrangedora por ser negra e estrangeira no Japão — Foto: Arquivo pessoal

Aos 21 anos, Marina passou em um processo seletivo para intercâmbio na Universidade de Mie, entre 2013 e 2014. Foi a primeira vez que viajou de avião.

"Nunca imaginaria que, um dia, estaria no Japão. Até então, o máximo, o mais distante que tinha conseguido ir foi a USP", lembra.

Literalmente, ela frisa: não viajava e transitava principalmente pela zona leste, logo foi um salto para o campus Cidade Universitária e, depois, para o campus de Tsu, na província japonesa de Mie.

"Minha mãe dizia: estudo é a única coisa que nós, pobres, conseguimos e que ninguém pode tirar. É o que leva a gente longe", relata. "Você pode encontrar gente que olha torto, mas você não pode ficar com medo de sair pelo mundo. Medo de preconceito? Estou preparada, calejada."

De volta a São Paulo após a conclusão do intercâmbio, Marina se formou bacharel em letras, com habilitações em português e japonês, e licenciatura em português. Fez traduções e desenvolveu estudos sobre mangás (quadrinhos japoneses), cultura pop japonesa no contexto da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). No Brasil, estudou estereótipos femininos no mangá de estilo Shōjo, voltado ao público feminino adolescente.

Depois da faculdade, foi trabalhar em uma associação cultural nikkei de Osasco. Nikkei quer dizer descendentes de japoneses nascidos fora do Japão. "Fui a primeira não-nikkei ali", diz ela, que é descendente de indígenas e negros.

Da USP para Tohoku

Mari e seu marido Júlio se dedicam aos estudos da cultura e língua japonesa — Foto: Arquivo pessoal
Mari e seu marido Júlio se dedicam aos estudos da cultura e língua japonesa — Foto: Arquivo pessoal

Marina se casou com Júlio César da Silva do Nascimento, 29, também graduado em letras na USP, também intercambista entre 2013 e 2014. Ele foi o primeiro de sua família a fazer faculdade.

Júlio conquistou uma bolsa de estudos do Ministério da Educação, Cultura, Esportes, Ciência e Tecnologia do Japão (Mext) para o programa de pós-graduação em Estudos Japoneses Globais na Universidade de Tohoku. Ele se mudou para a cidade de Sendai, a capital da província de Miyagi, em abril de 2018. Ela, que também queria voltar a viver no Japão, escreveu a um professor, possível orientador para a pesquisa acadêmica que gostaria de realizar.

O professor a aceitou como aluna ouvinte, o que lhe permitiu pedir o visto japonês. Ao longo de meses, organizou documentos, economizou R$ 5 mil e comprou a passagem, só de ida. Depois de um semestre como ouvinte, Marina passou no processo seletivo para o mestrado no programa de Estudos Japoneses Contemporâneos da Universidade de Tohoku, por coincidência, o primeiro campus do arquipélago a aceitar inscrições de estudantes estrangeiros e do sexo feminino, em 1913.

Marina conta que nunca passou situação crítica ou constrangedora por ser negra e estrangeira no Japão. Passou a dar aulas de inglês em um tipo de cursinho pré-vestibular à noite e aulas de japonês para crianças, filhos de dekasseguis (descendentes de japoneses que migram para trabalhar temporariamente no país).

Na universidade, propôs uma pesquisa sobre feminismo japonês no século 19. "O tchan", diz ela, "foi o foco na autora Kishida Toshiko [1863-1901], uma das primeiras feministas japonesas."

A mestranda traduziu e analisou textos de Kishida, de Kyoto, engajada na defesa da igualdade de gênero, inclusão e independência de mulheres diante dos homens no Japão. Em 1883, depois de realizar um discurso público sobre a condição feminina, intitulado Daughters in boxes, Kishida foi presa, julgada e multada por fazer uma manifestação política sem autorização.

"Ela era questionadora, fazia perguntas: 'Mas quem determinou essas regras?', 'Quem disse que deve ser assim?' Tem um alinhamento forte com a teoria feminista atual, que não diz o que a gente deve ser, mas procurar pontos de interseccionalidade. Que mulher", diz.

Mais recentemente, Marina lançou os quadrinhos The bride of the fox, que contam a história de Nubia, a primogênita do rei de um remoto arquipélago, um romance que também perpassa questões femininas. Tímida, ela conta que ficou surpresa com a repercussão de sua história na internet e pretende emendar um doutorado. "Sempre quis ser professora, para fazer a diferença."

"Nos últimos dias, conversamos sobre o que significa estar neste momento. Educação não deve ser uma questão só de conquista individual, mas ter um impacto para motivar as pessoas a seguirem os estudos", diz Júlio, que já trabalhou com alfabetização de moradores de rua e jovens saindo da Fundação Casa, instituição para menores infratores.

"Nós enfrentamos tantas dificuldades para estar aqui, estudar aqui. É fantástico que as pessoas olhem para alguém [como Marina] e pensem: é possível, estudar te leva longe."

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FMI melhora projeções para a economia global, mas condiciona otimismo ao ritmo de vacinação

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Enquanto campanhas avançam, órgão pede continuidade de estímulos monetários para retomada da atividade, mas pede prudência e focalização de políticas públicas; Brasil segue abaixo da média global de crescimento.
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Por G1
06/04/2021 09h30 
Postado em 06 de abril de 2021 às 12h45m


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Uma pessoa ficou ferida após a explosão de uma carta-bomba no escritório do Fundo Monetário Internacional (FMI) em Paris — Foto: Mandel Ngan/AFP
Uma pessoa ficou ferida após a explosão de uma carta-bomba no escritório do Fundo Monetário Internacional (FMI) em Paris — Foto: Mandel Ngan/AFP

A economia global poderia ter queda três vezes maior, não fossem os estímulos monetários injetados pelos bancos centrais durante a pandemia do coronavírus, mas a persistência de números surpreendentes depende da vacinação em massa. A conclusão está na nova edição do relatório "World Economic Outlook", do Fundo Monetário Internacional (FMI), divulgado nesta terça-feira (6).

Com esses estímulos monetários ainda irrigando as economias, o FMI revisou para cima as projeções de crescimento global para 2021 e 2022. A alta deve ser de 6% neste ano e 4,4% no próximo. O aumento é de 0,8 e 0,2 ponto percentual em relação ao relatório de outubro, respectivamente.

O Brasil está abaixo da média, com crescimento previsto de 3,7% neste ano e 2,6% no próximo. Comparado à edição de outubro, houve alta de 0,9 e 0,3 ponto percentual para a projeção do país em cada ano, respectivamente.

Por outro lado, o país tem desempenho melhor que a região onde está inserido, da América Latina e Caribe. Com queda de 4,1% em 2020, o país sofreu menos que os 7% da zona a que pertence. As altas de 4,6% e 3,1% previstas para a região, portanto, vem de uma base de queda mais intensa.

Em carta publicada no relatório, a economista-chefe do FMI, Gita Gopinath, reforça que as incertezas continuam no ambiente econômico global, mas uma saída passa a ser "cada vez mais visível".

O FMI ressalta, entretanto, que a vacinação contra a Covid-19 é fator primordial para que os números se tornem realidade. A variável é tão importante que o fundo avisa que um desempenho melhor que o esperado pode dar vigor à recuperação em todo mundo, mas novas variantes que coloquem em xeque a efetividade das vacinas causariam uma severa revisão para baixo.

Desempenho esperado do PIB global do FMI — Foto: G1 Economia
Desempenho esperado do PIB global do FMI — Foto: G1 Economia

O FMI fez uma série de revisões para cima ao longo de 2020, conforme as economias reagiram à pandemia do coronavírus. O maior otimismo do órgão um ano adentro da pandemia tem como plano de fundo, além da ação monetária e das vacinas, uma certa adaptação à "vida em pandemia".

O tombo previsto para a economia global em 2020 é de 3,3%, com impacto desigual a depender do perfil de cada país e de sua força de trabalho. As consequências serão particularmente agudas em países dependentes do turismo, com dívida pública mais alta e menor capacidade de vasto atendimento de saúde.

"Jovens, mulheres, trabalhadores com nível de escolaridade relativamente baixo e os empregados informais foram atingidos com mais força", diz o órgão. 
Desigualdade em pauta
Gita Gopinath, economista-chefe do FMI: "As políticas monetárias terão que se tornar mais direcionadas para manter a capacidade de sustentar a atividade econômica durante este período incerto." — Foto: REUTERS/Rodrigo Garrido
Gita Gopinath, economista-chefe do FMI: "As políticas monetárias terão que se tornar mais direcionadas para manter a capacidade de sustentar a atividade econômica durante este período incerto." — Foto: REUTERS/Rodrigo Garrido

No relatório, Gita Gopinath reconhece que o vigor de retomada é mais claro em economias desenvolvidas. Exceto a China, que já recuperou seus níveis de PIB pré-pandemia ainda em 2020, a economista lembra que os Estados Unidos estão em estágio avançado de recuperação e devem atingir o marco ainda em 2021.

Além de pacotes de estímulos históricos, que despejaram mais de US$ 5 trilhões na economia, os americanos têm a mais abrangente e veloz vacinação do mundo.

Outras economias importantes, como as europeias, que têm vacinação em atraso, só retomarão o patamar em 2022, diz o FMI. Emergentes só devem chegar nesse marco em 2023.

Gopinath lembra que a renda per capita é outro fator de preocupação do FMI, com impacto em toda a cadeia global. No biênio 2020-2022, a expectativa é de perda de 20% do PIB per capita em países emergentes – excluída novamente a China – e de 11% nas economias desenvolvidas.

"Isso reverteu os ganhos na redução da pobreza, com mais 95 milhões de pessoas previstas para entrar nas categorias de extrema pobreza em 2020, e 80 milhões a mais subnutridos do que antes", diz ela.

O quadro é ainda mais grave, pois o mercado de trabalho está punindo mais o trabalhador sem experiência prévia ou com baixa capacitação, grupos que já têm como característica uma renda menor.

"As políticas, portanto, terão que se tornar mais direcionadas para manter a capacidade de sustentar a atividade econômica durante este período incerto à medida que a corrida entre o vírus e as vacinas se desenrola", afirma a economista.

A cooperação internacional, diz o FMI, também será vital para garantir que as economias emergentes e países em desenvolvimento possam diminuir a distância entre seus padrões de vida comparados aos de alta renda.

PIB do G-20 cresce 2,1% nos últimos três meses de 2020
PIB do G-20 cresce 2,1% nos últimos três meses de 2020

Prudência

Com os olhos atentos ao caminhar das vacinações ao redor do mundo, o FMI sugere que os governantes tenham prudência nos próximos passos. A entidade, inclusive, indica alguns pontos de atenção para que a tomada de decisão seja certeira enquanto persistem os efeitos da pandemia mundo afora.

  • Prioridade aos gastos com saúde, incluindo atendimento hospitalar, tratamento para a Covid-19, produção e aplicação de vacinas;
  • Fortalecer políticas de proteção social, desde trabalhadores informais até ampliação dos critérios para acesso ao seguro-desemprego;
  • Com normalização do mercado de trabalho, arrefecer possíveis impactos nas empresas, investir em capacitação da mão de obra, dar subsídios para contratação e criação de vagas de emprego;
  • Políticas de facilitação de falências, com objetivo de acelerar a alocação eficiente de capital;
  • Investimento em educação para compensar as perdas da formação de crianças durante a pandemia.

Resolvida a crise de saúde, o FMI recomenda ainda um foco especial em um direcionamento para o desenvolvimento sustentável.

"As prioridades devem incluir o investimento em infraestrutura verde para ajudar a mitigar as mudanças climáticas, o fortalecimento da assistência social e da seguridade social para conter o aumento da desigualdade, a introdução de iniciativas para aumentar a capacidade produtiva e se adaptar a uma economia mais digitalizada e resolver os excessos da dívida", diz a carta de Gita Gopinath.

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Coronavírus: o que se sabe sobre efeitos de tipos sanguíneos em casos graves de Covid-19

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No início da pandemia, cientistas chineses apontaram que sangue A teria chance maior de infecção e tipo O, menor. Outros estudos têm resultados diferentes. Afinal, o que a ciência sabe sobre a relação entre tipos sanguíneos e Covid-19?
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Por Mariana Alvim, BBC

Postado em 06 de abril de 2021 às 10h45m


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Artigo na revista científica Blood Advances, publicada mês passado, afirmou que coronavírus tem 'forte preferência' em se ligar a proteínas que só o tipo sanguíneo A tem — Foto: Getty Images/John Foxx via BBC
Artigo na revista científica Blood Advances, publicada mês passado, afirmou que coronavírus tem 'forte preferência' em se ligar a proteínas que só o tipo sanguíneo A tem — Foto: Getty Images/John Foxx via BBC

Para responder a uma pergunta que surgiu logo no início da pandemia e ainda está em aberto, uma equipe de cientistas decidiu observar, a nível microscópico, como proteínas do coronavírus Sars-CoV-2 interagem com proteínas de células humanas antes de infectá-las.

A pergunta que vem motivando dezenas de pesquisas como essa, divulgada no último mês, é a seguinte: o coronavírus tende mais a ser mais perigoso para algum tipo sanguíneo do sistema ABO — O, A, B ou AB?

A resposta oferecida pela pesquisa, publicada em março na revista científica Blood Advances, foi a de que sim, o coronavírus mostra uma "forte preferência" em se ligar a proteínas que só o tipo sanguíneo A tem, particularmente aquelas presentes nas células respiratórias nos pulmões.

O mesmo não foi observado em células dos tipos sanguíneos B ou O, também avaliadas.

Segundos os autores, das faculdades de medicina de Harvard e Emory (EUA), o experimento demonstrou "conexão direta entre o tipo sanguíneo A e o SARS-CoV-2" e é uma "evidência adicional de que alguns tipos sanguíneos podem estar associados com um risco maior de contrair a doença".

Entretanto, cientistas entrevistados pela BBC News Brasil alertam que resultados como esse são preliminares e que não há consenso sobre a associação entre tipos sanguíneos e Covid-19. Portanto, ter um ou outro tipo sanguíneo não é motivo para desespero e menos ainda para descuido com medidas preventivas contra a doença.

A desconfiança de que a Covid-19 poderia se manifestar de forma diferente, a depender do tipo sanguíneo, veio em parte pelo fato de que algumas doenças demonstraram ser influenciadas por isso. Estudos já apontaram maior vulnerabilidade ou proteção de certos tipos sanguíneos a enfermidades como malária, hepatite B, AIDS, infecções pelos vírus Norwalk e pela bactéria H. pylori, entre outras.

E, mais importante, no surto causado pelo Sars-Cov — "parente" do Sars-CoV-2 — no início dos anos 2000, alguns cientistas encontraram evidências de que o sangue tipo O poderia ter um efeito protetivo contra o vírus. Isso foi reforçado pelo próprio estudo na Blood Advances do mês passado, que verificou em laboratório que o Sars-Cov tem a mesma preferência por células respiratórias presentes em pessoas do tipo sanguíneo A.

VÍDEO: Entenda como o coronavírus age no corpo humano
VÍDEO: Entenda como o coronavírus age no corpo humano

Sobre o Sars-CoV-2, a primeira grande evidência neste sentido veio em março de 2020, quando pesquisadores de instituições chinesas publicaram um artigo do tipo pré-print (sem a avaliação dos pares, um procedimento padrão de revistas de excelência, pelo qual cientistas independentes julgam um estudo) com dados de pessoas infectadas e tratadas nas cidades de Wuhan e Shenzhen.

A distribuição de pessoas por tipo sanguíneo neste conjunto de pacientes foi então comparada com um outro grupo, contendo um número de pessoas semelhante e vivendo nas mesmas cidades — só que elas não estavam infectadas.

O percentual de pessoas com tipo A foi maior no grupo de infectados do que na população "normal", enquanto o de pessoas com tipo O foi menor entre os pacientes com Covid-19. Além do risco de infecção, pesquisadores disseram também que o risco de morte era maior no tipo A e menor no tipo O.

Pesquisadores das faculdades de medicina de Harvard e Emory foram até o laboratório para observar como coronavírus interagiu com antígenos de diferentes tipos sanguíneos — Foto: Science Photo Library
Pesquisadores das faculdades de medicina de Harvard e Emory foram até o laboratório para observar como coronavírus interagiu com antígenos de diferentes tipos sanguíneos — Foto: Science Photo Library

Pesquisas com resultados distintos

Desde então, dezenas de outros estudos sobre o assunto foram publicadas pelo mundo — alguns com resultados significativamente diferentes do apontado pelo pré-print chinês.

Isso nos lembra que, na ciência, o que pode parecer com idas e vindas, contradições e até erros é, na verdade, parte do próprio processo científico — como explicou a bióloga Natalia Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência, à BBC News Brasil no ano passado.

"A ciência não é dogmática, ela tem um processo contínuo de acúmulo de evidências. Neste momento, trabalhamos com as melhores evidências existentes. Esse processo às vezes passa a impressão de que o cientista não sabe o que está fazendo, que ele muda de ideia. A ciência muda de ideia, sim — tem que mudar, quando está diante das melhores evidências."

Embora alguns estudos tenham abordado também o fator Rh — positivo ou negativo, ou o + ou - que aparece ao lado das letras —, a maioria priorizou apenas o chamado sistema ABO.

Publicado em julho de 2020 na revista científica Annals of Hematology, um trabalho de médicos atuando em Boston (EUA) confirmou que pessoas com tipos sanguíneos B e AB tinham maior probabilidade de receber um teste positivo para coronavírus, enquanto os com tipo O tinham menor probabilidade.

O tipo sanguíneo A, destaque preocupante em outros estudos, apareceu neste como estatisticamente indiferente na maior ou menor probabilidade de infecção. O estudo considerou dados de aproximadamente 1,2 mil pessoas com testes positivos para Covid-19.

Diferente do observado nas infecções, o artigo na Annals of Hematology afirmou que, em relação ao risco de intubação ou morte, o grupo sanguíneo ABO pareceu não interferir.

Em outubro de 2020, um novo estudo, com dados nacionais da Dinamarca, mostrou que o tipo O teve um efeito de proteção contra a infecção por Covid-19, mas o tipo sanguíneo não apresentou influência no risco de hospitalização ou morte.

A pesquisa comparou a distribuição percentual por tipo sanguíneo de um grupo de 7.422 pessoas com Covid-19 confirmada com dados populacionais de referência, de pessoas não testadas, reunindo cerca de 2,2 milhões de pessoas. Enquanto, entre os infectados, 38% eram do grupo O, na população em geral o percentual era de 42%, indicando que esse tipo sanguíneo seria menos vulnerável à infecção pelo Sars-CoV-2.

Teste de identificação de tipos sanguíneos — eles já foram associados a maior ou menor risco para doenças como malária e hepatite B — Foto: Getty Images/Goja1 via BBC
Teste de identificação de tipos sanguíneos — eles já foram associados a maior ou menor risco para doenças como malária e hepatite B — Foto: Getty Images/Goja1 via BBC

O 'estudo ideal' para o tema

Em uma troca de e-mails com a BBC News Brasil, Sean R. Stowell, médico e pesquisador no hospital Brigham and Women's, em Boston, opinou sobre diferentes resultados entre os estudos, inclusive em comparação com o seu — ele é um dos autores da publicação, em março de 2021, na Blood Advances.

Segundo Stowell, metodologias distintas e outros fatores influenciando a infecção e agravamento da covid-19, para além do tipo sanguíneo, explicam diferentes resultados. É possível imaginar o tipo de estudo ideal para responder à questão, mas ele seria impossível de ser realizado.

"Um estudo prospectivo com uma população de pacientes com tipos sanguíneos conhecidos e uma igual exposição ao vírus seria necessário. Mas um trabalho deste tipo provavelmente nunca vai acontecer, então, sob uma rigorosa perspectiva clínica e correlacional, acho que vai ser impossível saber com certeza (se o tipo sanguíneo influencia ou não)", escreveu o médico e PhD.

"Qual seria o tipo de pesquisa 'ideal' para responder a essa questão? Seria justamente uma análise da exposição ao vírus entre pessoas com diferentes tipos sanguíneos. Entretanto, um estudo assim seria completamente antiético e, portanto, nunca será feito. Como consequência, nos restam estudos de correlação e experimentos em laboratório com o vírus."

Ele continua: "Por isso nos voltamos ao vírus e aos antígenos (proteínas) dos grupos sanguíneos em si, e descobrimos que uma estrutura-chave na superfície do vírus que ele usa para entrar nas nossas células e infectá-las também se liga diretamente ao tipo sanguíneo A. Esses resultados são os primeiros a demonstrar uma associação direta entre o tipo A e o Sars-CoV-2, mas novos estudos certamente são necessários", concluiu, apontando ainda para a importância de pesquisas considerando novas variantes do coronavírus.

No Brasil

Estudos no Brasil e no mundo estão tentando responder se tipo sanguíneo pode influenciar na infecção, gravidade de mortalidade por covid-19 — Foto: Getty Images via BBC
Estudos no Brasil e no mundo estão tentando responder se tipo sanguíneo pode influenciar na infecção, gravidade de mortalidade por covid-19 — Foto: Getty Images via BBC

Pesquisadores e médicos brasileiros também estão buscando, por aqui, correlações entre tipo sanguíneo e Covid-19.

O médico Gil de Santis, hemoterapeuta do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da USP, brinca que "caiu no colo" dele o dado de maior prevalência de pessoas com tipo sanguíneo A entre os pacientes mais graves.

Ele e sua equipe estavam realizando um ensaio clínico randomizado controlado (experimento envolvendo humanos que é considerado "padrão ouro" em testes com remédios e vacinas) com o tratamento de plasma convalescente (a parte líquida do sangue, contendo anticorpos que podem ser infundidos em outras pessoas adoecidas com Covid-19), quando perceberam outra coisa.

"Alguns meses depois do início do ensaio clínico, percebi que tinha uma coisa muito esquisita ali. A gente tinha que tipar (registrar o tipo sanguíneo) os pacientes para transfundir o plasma, e percebi que tinha muito mais A do que O — uma inversão do que se observa na população, tanto a brasileira quanto a nossa", conta.

A reportagem não encontrou dados atualizados e consolidados da divisão sanguínea no Brasil, já que é mais comum que hemocentros em diferentes cidades e estados façam esse levantamento a nível local. Entretanto, segundo os entrevistados, a maior parcela da população brasileira é do tipo O, seguido do A (ambos entre 40-50% da população), B e AB (ambos com menos de 10%).

A tipagem sanguínea está associada a grupos étnicos, entre outros fatores, portanto diferentes partes do mundo podem ter quadros de distribuição bastante diferentes.

A equipe de Ribeirão Preto então comparou o percentual por tipo sanguíneo em um grupo de 72 pacientes com Covid-19 grave contra 160 pessoas em um grupo controle, da população local. O tipo A se mostrou mais presente no grupo de pacientes do que o normal (51% versus 30% na população), enquanto o O se mostrou menos presente entre os doentes graves (31,9% versus 48% no grupo controle).

Ser do tipo A significou um risco 2,5 vezes maior de gravidade, na comparação com O. Os resultados completos devem ser publicados em breve em uma revista científica estrangeira.

"Mas é importante lembrar que outras situações, as comorbidades, são muito mais importantes do que o tipo sanguíneo. Se este aumenta em 2,5 vezes, a doença coronariana pode aumentar em 20 vezes o risco, a diabetes entre 5 e 7 vezes… Então as comorbidades são muito mais importantes do que o tipo ABO, mas este também contribui um pouco", aponta Santis.

Já em Passo Fundo (RS), a equipe do serviço de hemoterapia do Hospital São Vicente de Paulo passou a observar uma maior demanda por transfusões de sangue do tipo A em pacientes graves com Covid-19 — e então resolveram investigar mais, publicando em novembro resultados preliminares na revista científica Hematology, Transfusion and Cell Therapy.

"Tivemos um aumento na demanda transfusional para esses pacientes, em especial do grupo A, então houve momentos, na gestão do nosso estoque, em que tivemos que chamar mais doadores do grupo A", conta a hematologista Cristiane Rodrigues de Araújo, responsável pelo setor de hemoterapia do hospital e professora da Faculdade de Medicina da Universidade de Passo Fundo (UPF).

"Analisamos uma pequena amostra, de 53 pacientes em um universo de 1.200 contaminados, que precisaram de transfusão sanguínea. Comparada com nossa demanda normal, que é 35% do grupo A, esses pacientes (graves com Covid-19) eram 47% de sangue tipo A. Então lógico que precisamos de novos estudos, com amostras maiores, mas realmente encontramos uma prevalência um pouco maior (do sangue A) do que o habitual no nosso universo de pacientes."

Uma equipe do Hemocentro de Goiás (HEMOGO) também publicou no ano passado resultados preliminares a partir de dados de 98 pessoas que tinham tido Covid-19 e se voluntariaram para a doação de plasma convalescente. Este tratamento está em estudo no hemocentro e também já está sendo fornecido para alguns hospitais da região, mediante solicitação.

"Vimos que dos 98 pacientes, a maioria era do tipo sanguíneo O, e em segundo lugar, do tipo sanguíneo A — que é a distribuição na nossa população", explica a hematologista Maria Amorelli, do HEMOGO, apontando que nestes dados sobre adoecimento, o tipo sanguíneo não pareceu influenciar.

Na avaliação de quadros graves, a equipe descobriu que a maior prevalência era de pacientes com sangue tipo AB, enquanto nenhum paciente do tipo sanguíneo A precisou de internação — indo de encontro aos resultados de outros estudos.

"Essa ideia de que todos os pacientes que não têm o anticorpo anti-A (entenda logo abaixo) estariam em maior risco, a gente não conseguiu confirmar."

"Acredito que isso pode ter acontecido por uma série de fatores, uma delas a quantidade ainda pequena de pacientes que avaliamos. A outra é que a população de doadores é mais selecionada — em geral, pacientes do grupo O têm mais tendência a doar, porque têm aquela ideia de que este é o melhor sangue para a doação. Então precisamos de mais estudos, mas a literatura ainda não conseguiu confirmar essa associação (entre tipo sanguíneo e risco para covid)."

"Até então, as descobertas não foram relevantes a ponto de modificar nosso comportamento clínico em relação às doenças. Não é, por exemplo, algo que a gente pesquise de cara para saber se um paciente vai ter mais ou menos risco."

"Então quem é do tipo sanguíneo A não precisa se desesperar, porque vários pacientes desse tipo tiveram a doença leve; e vários pacientes do tipo sanguíneo O também tiveram quadros graves", aconselha a hematologista. 
Anticorpos, antígenos e coagulação

A médica explica que antígenos são proteínas presentes nas células sanguíneas e que variam de tipo a tipo — um paciente do tipo sanguíneo A, por exemplo, tem o antígeno A. Foi, inclusive, pelo antígeno A que o coronavírus mostrou ter preferência no estudo publicado em março na revista Blood Advances.

Mas ter um tipo sanguíneo significa também ter anticorpos naturais contra os outros tipos — um paciente com sangue tipo A tem anticorpo anti-B; sangue tipo B, anticorpo A; e O tem anti-A e anti-B (não existe antígeno O ou anticorpo anti-O).

"São anticorpos naturais, até hoje a gente não sabe exatamente por que existem. A gente já sabe que são causadores de reações graves nos erros transfusionais: por exemplo, se um paciente O recebe sangue do tipo A, aquele anti-A vai hemolisar o sangue e gerar uma reação grave", exemplifica a hematologista.

Além da função esperada de proteger contra um sangue que não é compatível, alguns cientistas passaram então a levantar a hipótese de que esses anticorpos naturais pudessem ter ainda outras funções.

"Sugere-se que talvez esse anti-A tenha um efeito protetor para algumas doenças virais, com o anticorpo dificultando a entrada do vírus na célula", diz Amorelli.

Gil de Santis explica que as pesquisas sobre Covid-19 têm focado na possível vulnerabilidade do antígeno A e no que seria um efeito protetivo do anticorpo anti-A, deixando muitas vezes de fora o antígeno B e o anti-B, porque o tipo A é muito mais numeroso do que o tipo B em populações como a brasileira.

Distúrbios na circulação do sangue pelo corpo explicam em parte adoecimento por covid-19 — Foto: Getty Images/Michal-Rojek via BBC
Distúrbios na circulação do sangue pelo corpo explicam em parte adoecimento por covid-19 — Foto: Getty Images/Michal-Rojek via BBC

Mas além dos antígenos e anticorpos, o médico explica que há ainda um terceiro fator que pode explicar a influência dos tipos sanguíneos na Covid-19.

"A coagulação é mais intensa no sangue A do que no O, e a coagulação favorece a trombose", diz, apontando que pessoas com tipo sanguíneo A tendem a ter mais componentes "pró-coagulantes", o fator de Von Willebrand e o fator VIII, e pessoas com tipo O, menos.

"E uma das complicações da Covid-19 é a exatamente a trombose, nos casos mais graves. O tromboembolismo pulmonar é uma complicação muito frequente em pacientes na UTI, em um terço, um quarto dos pacientes com covid grave. É uma barbaridade, uma complicação que a gente não via em outros tipos de infecções virais."

E para quem desconfiou, após tantos dados favoráveis ao tipo sanguíneo O, Gil de Santis afirma que há indícios de que se trata de um beneficiado na seleção natural.

"O tipo O parece ser um mutante que deu certo, digamos assim."

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