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Correspondências foram enviadas por uma religiosa que vivia em Londrina.
Material foi encontrado por voluntários que organizam o acervo do colégio.
Material foi encontrado por voluntários que organizam o acervo do colégio.
Três cartas enviadas de Londrina, no norte do Paraná, para a Alemanha, entre 1939 e 1941, foram censuradas (Foto: Rodrigo Saviani/G1)
As cartas escritas pela freira de Schoenstatt irmã Mariavirgo foram devolvidas ao colégio quase 50 anos depois de serem remetidas. Com a descoberta, os materiais devem ir para o acervo do colégio, fundado em 1936.
A irmã Mariavirgo, nome que faz referência a Virgem Maria, se chamava Gabriele Moser. Ela veio da Alemanha para o Brasil em 1935, junto com outras religiosas. Depois, chegou a Londrina um ano depois, vinda de Jacarezinho, também no norte do Paraná.
O destinatário descrito nos envelopes é o pai de Gabriele, Ludwig Moser, morador da pequena cidade de Geislingen. Foram encontradas três correspondências, todas apresentando o selo de censura do Terceiro Reich.
Cartas foram escritas pela Irmã Mariavirgo, que chegou ao
Brasil em 1935 (Foto: Arquivo/Colégio Mãe de Deus)
Brasil em 1935 (Foto: Arquivo/Colégio Mãe de Deus)
"Foi uma surpresa grande quando encontramos as cartas. Pelos envelopes, vimos que eram cartas censuradas pelo nazismo e ficamos curiosos, nos perguntando 'o que contêm essas cartas para serem censuradas, o que a irmã estaria contando'", diz Elenice Dequech, voluntária que auxilia na organização do acervo histórico do colégio.
As cartas foram encaminhadas para uma religiosa do colégio, que iniciou a tradução do texto. Ela conheceu a própria irmã Mariavirgo, que ficou no no colégio até falecer. "Vamos interpretá-las devidamente, e que fique uma nova fonte para ver o quanto essas irmãs se dedicaram", diz a irmã Maria Fernanda Balan, que auxiliou na tradução dos textos durante a reportagem.
As correspondências
As cartas são escritas em papel de seda e outros tipos. Provavelmente, a irmã utilizou bico de pena e apresenta uma bela caligrafia. Em cada correspondência, Mariavirgo inicia com a saudação “Ave Maria”.
Na primeira carta, datada de 15 de outubro de 1939, irmã Mariavirgo já mostra preocupação se as correspondências enviadas estavam mesmo chegando ao destino “Ontem recebi a noticia que a carta teve um desvio”, escreveu.
Nesta mesma carta, Mariavirgo também mostra outra preocupação: a guerra. O ano coincide com o começo da Segunda Guerra Mundial.
“Como será que vocês estão? O jornal de hoje não relata nada de alegre, mas não se pode acreditar em tudo”. Depois, a religiosa tranquiliza a família, pedindo que “não se preocupem porque estou muito bem”.
A irmã contava ainda que estava trabalhando no jardim de infância, com 20 crianças. Ela relatou que a maior dificuldade é o idioma, apesar de conhecer algumas palavras que seriam necessárias para o ensino.
Mariavirgo detalha aos pais como era a cidade de Londrina na época. "Londrina está com mais ou menos 12 mil moradores. A mata virgem vai aos poucos sendo derrubada", descreve. Fala ainda das plantações de “café, milho e feijão, laranjas e bananeiras”. Sobre os moradores, a irmã os considerava "muito filial, fácil de comunicar".
Em uma das cartas, irmã Mariavirgo diz que ficava admirada com o céu estrelado de Londrina, e desenha o Cruzeiro do Sul (Foto: Rodrigo Saviani/G1)
Nas outras correspondências, o conteúdo é parecido, mesclando a preocupação da situação dos pais na Alemanha, contando a rotina no Colégio Mãe de Deus, como a chegada de novas religiosas, e lembrando de outros familiares e amigos.
Na carta datada de 25 de março de 1941, ela lamenta por não conseguir escrever antes. “Não pude com isso cumprimentar o pai pelo aniversário de 60 anos, mas eu não esqueci.
O bom Deus ainda conceda muitos anos de vida, saúde e alegria.” Ela ainda agradece pelas cartas recebidas no período. “Eu gostaria de dizer um Deus lhes pague pelas duas cartas que enviaram. Os senhores me causaram muita alegria”, relata.
Cartas apresentam o carimbo com o símbolo do alto
comando das Forças Armadas do governo nazista
(Foto: Rodrigo Saviani/G1)
comando das Forças Armadas do governo nazista
(Foto: Rodrigo Saviani/G1)
Nos envelopes, estão inscrições mencionando que as cartas foram abertos e passaram por um censor. Uma delas tem o adesivo escrito "censor 1162", número referente provavelmente ao funcionário que violou a correspondência. Também são vistos vários carimbos do alto comando das Forças Armadas do governo nazista.
Para a irmã Maria Fernanda Balan, a censura pode ser motivada porque o Brasil não era um aliado da Alemanha na guerra. “As irmãs também sofriam preconceito aqui, porque aqui tudo o que era alemão era odiado. Se generalizava que os alemães provocaram a Segunda Guerra Mundial", opina.
Outro motivo é o fato de a carta ser escrita por uma religiosa do movimento de Schoenstatt, fundado pelo padre José Kentenich que se posicionava contra o nazismo. “Ele foi perseguido pelo sistema nazista por ser um líder, uma pessoa que exercia influência social na Alemanha”. Kentenich ficou preso por três anos em um campo de concentração próximo a Munique, sendo libertado por causa do fim a guerra.
“Padre Kentenich viu que era necessário formar um novo tipo de homem, um novo tipo de personalidade, baseada pela liberdade, educada pelo amor, em contraposição ao sistema da época”, explica a irmã Maria Fernanda.
Acervo histórico
As cartas devem fazer parte de um acervo histórico, que está sendo montado pelo Colégio Mãe de Deus. “Inicialmente, estamos fazendo um o processo de catalogação e de levantamento histórico, resgatando materiais que fazem parte dessa história de quase 80 anos”, explica o arquivista Amauri Gomes.
“Essas cartas fazem parte da história de Londrina, contam como era a cidade poucos anos depois da fundação. Então, é de grande importância localizar esse material e apresentar aos moradores”, afirma a voluntária Elenice Dequech, que auxilia no trabalho.
Rua Décio Monte Alegre, 20
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das 05:00 às 00:30
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