Cientistas imaginam que o histórico pode influenciar na intensidade da doença, mas ainda não podem provar. Pesquisa identifica partes do novo coronavírus que podem ser reconhecidas pelo sistema de defesa do corpo mesmo que ele nunca tenha tido contato com a infecção, pela semelhança com vírus que causam resfriados.
Por Lara Pinheiro, G1
05/08/2020 16h17 Atualizado há 4 horas
Postado em 05 de agosto de 2020 às 20h25m
Uma pesquisa publicada na terça-feira (4) na revista científica
"Science", uma das mais importantes do mundo, identificou partes do novo
coronavírus (Sars-CoV-2)
que podem ser reconhecidas pelo sistema de defesa do corpo mesmo que
ele nunca tenha tido contato com a infecção, pela semelhança com alguns
vírus que causam resfriados.
Essa semelhança, entretanto, não significa que ter tido resfriados no passado dê alguma proteção contra a Covid-19. No estudo, os pesquisadores destacam que essa possibilidade é uma especulação que ainda precisa ser provada com ensaios clínicos.
"A hipótese de imunidade cruzada entre Sars-CoV-2 e [vírus] HCoVs para resfriado comum ainda aguarda ensaios experimentais", afirmam os pesquisadores, de três universidades nos Estados Unidos e uma na Austrália.
Eles já sabiam, de estudos anteriores
feitos em vários países, que uma parte da população (entre 20% e 50%)
era capaz de "reconhecer" pedaços do novo coronavírus mesmo sem ter tido
contato com ele. Esse reconhecimento é feito com as células T,
um tipo de célula de defesa do corpo que é responsável por, além de
outras atividades, destruir células infectadas com vários tipos de vírus
(não só o Sars-CoV-2).
O que os cientistas não sabiam, entretanto, é como essas células T eram capazes de reconhecer o novo coronavírus sem nunca ter sido expostas a ele.
- IMUNIDADE: Na busca de imunidade contra a Covid, anticorpos deixam de ser único foco e ciência mira nas células T
- DEFESA: Na Suécia, estudo aponta eficácia das células T no combate ao novo coronavírus
Para tentar desvendar esse mecanismo, eles mapearam 142 partes do novo
coronavírus que, em indivíduos infectados, eram "reconhecidas" pelas
células T.
Depois, testaram, em laboratório, esses pedaços de vírus contra outras células T, retiradas de amostras de sangue colhidas antes do surgimento do novo coronavírus. Dessa forma, teriam certeza de que as células de defesa nunca teriam tido contato com o Sars-CoV-2.
Nos testes, viram que houve reação dessas células a algumas partes do
novo coronavírus. Com isso, demonstraram que as células tinham uma
"memória cruzada", que conseguia identificar partes do vírus da Covid-19
que eram semelhantes às de vários outros vírus da família corona,
causadores de resfriados. Por isso é que as células das amostras eram
capazes de identificar esses pedaços, de outros vírus, no Sars-CoV-2.
"Eles mostraram o mecanismo: você vê a célula reconhecendo ou não", explica Natália Machado Tavares, pesquisadora de imunologia e patologia da Fiocruz Bahia. "Isso não quer dizer que quem teve um resfriado comum causado por um coronavírus está imune", esclarece.
No estudo, os cientistas levantam essa hipótese: de
que essa "memória" das células T pode ter relação com a gravidade com
que uma pessoa desenvolve a Covid-19. Ou seja: poderia explicar por que algumas pessoas morrem enquanto outras têm apenas sintomas leves, ou nem sequer os apresentam. Mas isso não tem comprovação, frisam os autores.
"Com base nesses dados, é plausível supor que a memória das células T que têm reação cruzada preexistente em alguns doadores possa ser um fator contribuinte para variações nos resultados da doença do paciente com Covid-19, mas, no momento, é altamente especulativo", frisam.
Exposição
A professora e pesquisadora de imunologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)
Daniela Santoro Rosa explica que o estudo, apesar de trazer várias
possibilidades, não consegue dizer se essa exposição anterior a outros
tipos de coronavírus vai influenciar na gravidade clínica da Covid-19.
"O que a gente precisa saber é: o que isso causa para o indivíduo? Quem teve essa infecção com [outro] coronavírus, fez essa célula de memória e depois entrou em contato com o Sars-CoV-2, como foi a infecção pela Covid? Foi mais leve?", questiona a cientista.
- INTENSIDADE: Reação inicial do corpo à Covid-19 pode prever se a doença será grave, indica estudo liderado por brasileiros
- LONGO PRAZO: Imunidade contra a Covid-19 pode ser duradoura, sugere estudo publicado na Nature
Por fim, ela lembra que nem todos os resfriados são causados por coronavírus (vírus da família corona), e, na maioria das vezes, as pessoas não sabem qual tipo de vírus é o causador.
"Quando eles [cientistas] falam 'vírus do resfriado', eles falam do
resfriado causado por coronavírus, porque existem outros vírus que
causam resfriados: rinovírus, adenovírus", pondera Rosa.
'Imunidade de rebanho': o que é e quais os riscos de deixar a pandemia correr seu curso
Entenda algumas das expressões mais usadas na pandemia do covid-19
CORONAVÍRUS
------++-====-----------------------------------------------------------------------=================--------------------------------------------------------------------------------====-++------
Nenhum comentário:
Postar um comentário