## = ## RIO - Os US$ 300 milhões de bilheteria não mentem: Blu é um sucesso. A ararinha-azul, protagonista do filme "Rio", levou de volta aos holofotes a espécie, há dez anos sumida de seu habitat, a caatinga baiana. O último registro televisivo da ave in natura tem o dobro de tempo - foi a atração do primeiro programa "Globo Ecologia". Agora, os 71 indivíduos sobreviventes, sendo 66 erradicados do país, dependem de protetores particulares. O maior deles, um xeque do Qatar, prepara sua coleção para voltar aos céus nordestinos. Ele e o governo federal lançarão, até o fim do mês, um plano para definir o cronograma para a libertação de algumas aves. Até chegar a esta etapa, porém, são pelo menos cinco anos de trabalho.
VÍDEO:Um flagrante da ararinha-azul na caatinga brasileira
A ararinha-azul sempre despertou o fascínio dos endinheirados, tornando-se símbolo de status. Do desbravador holandês Maurício de Nassau ao líder iugoslavo Marechal Tito, diversas figuras históricas empoleiraram a ave fora das caraibeiras, a árvore que lhe serve de lar na caatinga. Quando o poder público finalmente encontrou Curaçá, a cidade onde a espécie mais se fez presente, os caçadores já agiam faz tempo. Nos anos 80, a Cyanopsitta spixxi - seu nome de laboratório - era vendida por até R$ 30 mil, em valores corrigidos.
- Em 1984, o patriarca da família que monopolizava esse comércio morreu - lembra Carlos Yamashita, ornitólogo especialista em araras. - Houve uma rixa entre dois de seus filhos, e o caçula, em vez de pegar só dois filhotes por ano, como fazia seu pai, levou 15 de uma vez. Foi a gota d'água para a espécie.
No fim daquela década, sobrou apenas um ararinha-azul macho na natureza. Foi ele o fotografado por Luiz Cláudio Marigo em uma expedição internacional, em 1990.
- Éramos quatro brasileiros e um inglês. Fomos do Piauí até a Bahia, onde finalmente encontramos um macho da espécie, já velho - conta o fotógrafo. - Quando divulgamos as imagens, recebemos um fax do Ibama nos condenando por supostamente termos chamado a atenção dos traficantes para a ave. Não houve, por parte do governo, uma iniciativa para protegê-la desse risco.
Cinco anos depois, a ararinha solitária ganhou um par à altura. Uma fêmea da espécie foi liberta na mesma região. O casal conviveu por sete semanas - não se sabe se copularam. Após este período, a ave recém-saída de cativeiro morreu ao entrar em contato com fios de alta tensão.
O choque elétrico é lembrado até hoje no Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão do governo federal responsável pela montagem de um plano para preservação da espécie. Um projeto, feito em parceria com a Al Wabra Wildlife Preservation, do Qatar, será divulgado ainda este mês.
- Para soltá-los, é necessário atingir uma população mínima, e o índice não será atingido nos próximos cinco anos - pondera Ugo Vercillo, coordenador-geral de Espécies Ameaçadas do ICMBio. - Vamos trabalhar na preparação de um ambiente para a soltura. Precisamos identificar que áreas servem para a libertação da espécie, quais são os animais que podem representar algum perigo, onde a ave pode pôr seus ninhos e se alimentar.
A Al Wabra é administrada pelo xeque Saoud Bin Mohammed Bin Ali Al Thani, o maior protetor de ararinhas-azuis do mundo: há 55 sob seus cuidados. A mais nova nasceu em março.
É comum que xeques do Golfo Pérsico colecionem animais exóticos. A maioria é adquirida ilegalmente em regiões instáveis do globo, como alguns países africanos. Cerca de dez anos atrás, Saoud resolveu mudar seu status: de colecionador passou a protetor. Para reforçar seu compromisso com a libertação das ararinhas, comprou uma fazenda na Bahia, onde as ararinhas voarão em liberdade daqui a alguns anos. Ainda é visto com desconfiança por alguns ambientalistas, mas, mesmo entre eles, há um consenso: sem o milionário do Qatar, é impossível imaginar algum futuro para as ararinhas.
- O xeque, aos poucos, adquiriu aves de colecionadores de diversos países, das Filipinas à Suíça. São pessoas que, por comprarem as ararinhas, foram a pé de cal da espécie - avalia o biólogo Francisco Pontual. - Mas, honestamente, não estou a fim de pôr o dedo em seu rosto. Ele é a única esperança concreta que surgiu desde 1990. Tudo isso é muito louco. É quase como se o chefe do tráfico de um morro fosse o único capaz de acabar com a violência causada pelo tráfico.
O australiano Ryan Watson foi o encarregado pelo xeque dos cuidados das ararinhas. Caberá a ele aumentar a incidência de acasalamentos - nos últimos sete anos, apenas 28 filhotes nasceram. Quanto maior for este reforço do efetivo, mais rápida será a volta das aves a seu habitat.
- Por enquanto, temos de esperar - conforma-se. - Mas, mesmo que nosso projeto seja bem-sucedido, duvido que um dia a espécie saia da lista das mais ameaçadas. As ararinhas têm uma diversidade genética muito limitada, e, portanto, dificuldade para adaptar-se a mudanças climáticas. Além disso, sua área de ocorrência é muito pequena. Seria capaz de sustentar uma população muito pequena, de menos de 500 indivíduos.
As ressalvas, porém, não o impedem de considerar a caatinga preparada para as aves. Já o ornitólogo Yamashita é mais cauteloso. Para ele, algumas intervenções humanas precisam ser corrigidas antes das ararinhas povoarem a região.
- O índice de desmatamento reduziu a quantidade de árvores usadas pela ararinha e os índices de chuvas. Está seco demais, mesmo para os padrões da caatinga.
VÍDEO:Um flagrante da ararinha-azul na caatinga brasileira
A ararinha-azul sempre despertou o fascínio dos endinheirados, tornando-se símbolo de status. Do desbravador holandês Maurício de Nassau ao líder iugoslavo Marechal Tito, diversas figuras históricas empoleiraram a ave fora das caraibeiras, a árvore que lhe serve de lar na caatinga. Quando o poder público finalmente encontrou Curaçá, a cidade onde a espécie mais se fez presente, os caçadores já agiam faz tempo. Nos anos 80, a Cyanopsitta spixxi - seu nome de laboratório - era vendida por até R$ 30 mil, em valores corrigidos.
- Em 1984, o patriarca da família que monopolizava esse comércio morreu - lembra Carlos Yamashita, ornitólogo especialista em araras. - Houve uma rixa entre dois de seus filhos, e o caçula, em vez de pegar só dois filhotes por ano, como fazia seu pai, levou 15 de uma vez. Foi a gota d'água para a espécie.
No fim daquela década, sobrou apenas um ararinha-azul macho na natureza. Foi ele o fotografado por Luiz Cláudio Marigo em uma expedição internacional, em 1990.
- Éramos quatro brasileiros e um inglês. Fomos do Piauí até a Bahia, onde finalmente encontramos um macho da espécie, já velho - conta o fotógrafo. - Quando divulgamos as imagens, recebemos um fax do Ibama nos condenando por supostamente termos chamado a atenção dos traficantes para a ave. Não houve, por parte do governo, uma iniciativa para protegê-la desse risco.
Cinco anos depois, a ararinha solitária ganhou um par à altura. Uma fêmea da espécie foi liberta na mesma região. O casal conviveu por sete semanas - não se sabe se copularam. Após este período, a ave recém-saída de cativeiro morreu ao entrar em contato com fios de alta tensão.
O choque elétrico é lembrado até hoje no Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão do governo federal responsável pela montagem de um plano para preservação da espécie. Um projeto, feito em parceria com a Al Wabra Wildlife Preservation, do Qatar, será divulgado ainda este mês.
- Para soltá-los, é necessário atingir uma população mínima, e o índice não será atingido nos próximos cinco anos - pondera Ugo Vercillo, coordenador-geral de Espécies Ameaçadas do ICMBio. - Vamos trabalhar na preparação de um ambiente para a soltura. Precisamos identificar que áreas servem para a libertação da espécie, quais são os animais que podem representar algum perigo, onde a ave pode pôr seus ninhos e se alimentar.
A Al Wabra é administrada pelo xeque Saoud Bin Mohammed Bin Ali Al Thani, o maior protetor de ararinhas-azuis do mundo: há 55 sob seus cuidados. A mais nova nasceu em março.
É comum que xeques do Golfo Pérsico colecionem animais exóticos. A maioria é adquirida ilegalmente em regiões instáveis do globo, como alguns países africanos. Cerca de dez anos atrás, Saoud resolveu mudar seu status: de colecionador passou a protetor. Para reforçar seu compromisso com a libertação das ararinhas, comprou uma fazenda na Bahia, onde as ararinhas voarão em liberdade daqui a alguns anos. Ainda é visto com desconfiança por alguns ambientalistas, mas, mesmo entre eles, há um consenso: sem o milionário do Qatar, é impossível imaginar algum futuro para as ararinhas.
- O xeque, aos poucos, adquiriu aves de colecionadores de diversos países, das Filipinas à Suíça. São pessoas que, por comprarem as ararinhas, foram a pé de cal da espécie - avalia o biólogo Francisco Pontual. - Mas, honestamente, não estou a fim de pôr o dedo em seu rosto. Ele é a única esperança concreta que surgiu desde 1990. Tudo isso é muito louco. É quase como se o chefe do tráfico de um morro fosse o único capaz de acabar com a violência causada pelo tráfico.
O australiano Ryan Watson foi o encarregado pelo xeque dos cuidados das ararinhas. Caberá a ele aumentar a incidência de acasalamentos - nos últimos sete anos, apenas 28 filhotes nasceram. Quanto maior for este reforço do efetivo, mais rápida será a volta das aves a seu habitat.
- Por enquanto, temos de esperar - conforma-se. - Mas, mesmo que nosso projeto seja bem-sucedido, duvido que um dia a espécie saia da lista das mais ameaçadas. As ararinhas têm uma diversidade genética muito limitada, e, portanto, dificuldade para adaptar-se a mudanças climáticas. Além disso, sua área de ocorrência é muito pequena. Seria capaz de sustentar uma população muito pequena, de menos de 500 indivíduos.
As ressalvas, porém, não o impedem de considerar a caatinga preparada para as aves. Já o ornitólogo Yamashita é mais cauteloso. Para ele, algumas intervenções humanas precisam ser corrigidas antes das ararinhas povoarem a região.
- O índice de desmatamento reduziu a quantidade de árvores usadas pela ararinha e os índices de chuvas. Está seco demais, mesmo para os padrões da caatinga.
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