Descoberta foi feita a partir de um microscópio 3D e revela o que estava escondido há mais de 300 anos: espermatozóides 'perfuram' o fluido, como parafusos.
Por Fabio Manzano, G1
01/08/2020 07h36 Atualizado há 4 horas
Postado em 01 de agosto de 2020 às 11h40m
Cientistas descobrem que espermatozoides na verdade ‘giram’, não ‘nadam’
A forma com que a ciência pensou, por mais de três séculos, o nado dos espermatozoides estava errada. É o que diz um estudo
publicado nesta sexta-feira (31) pela revista "Science Advances", a
partir de imagens coletadas por um microscópio 3D que revelou um
deslocamento em espiral.
O primeiro cientista a descrever o movimento dos espermatozoides foi o
holandês Antonie van Leeuwenhoek. Com seu microscópio, ele avistou em
1678 uma "cauda, que, quando nadava, se mexia como uma serpente, como
enguias na água".
Cientistas descobrem que espermatozoides na verdade ‘giram’, não ‘nadam’ — Foto: Divulgação/polymaths-lab.com
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A constatação de Leeuwenhoek foi pouco questionada, porque justamente
era isso que se podia ver com um microscópio comum. Mas em 2020, com a
tecnologia de microscopia tridimensional, pesquisadores da Universidade
de Bristol, no Reino Unido, e da Universidade Autônoma do México viram
algo mais: um movimento espiralado e giratório em todas as direções.
"O flagelo bate de uma maneira assimétrica somente para um lado, mas
ele vai rotacionando gradualmente e faz com que o espermatozoide anule
sua assimetria", explicou ao G1 o brasileiro Hermes
Gadêlha, professor da Universidade de Bristol e primeiro autor do
estudo. "Com isso, se consegue criar uma simetria através da
assimetria."
Para explicar, o matemático deu como exemplo o movimento de um pião em
que ele gira ao redor de si mesmo e também ao redor de seu eixo. Segundo
ele, é como se o gameta estivesse "perfurando o fluido".
"É um movimento de precessão, um termo emprestado da física", comentou o
pesquisador. "A terra tem um movimento de precessão, e é isso que dá
diferença do equinócio, solstício. Com o espermatozoide é quase como se
você tivesse dois movimentos rotatórios perfurando o fluido de uma
maneira muito bonita, muito elegante porque é aparentemente simétrico."
55 mil fotos
Para enxergar como o gameta menor que a espessura da metade de um fio
de cabelo se move, os pesquisadores usaram uma potente câmera capaz de
tirar 55 mil fotos a cada um segundo. Com isso, eles conseguiram
escanear os espermatozoides e identificar este movimento giratório.
"Ele é muito pequeno, tem 50 micrômetros", disse Gadêlha. "Além disso,
ele é muito rápido, ele nada em uma frequência entre 20 e 30 batimentos
por segundo e quando for escanear, tem que ser em uma velocidade tão
rápida que parece que o espermatozoide não está se movendo, ou como se
estivesse em slow motion."
Pode até parecer simples, mas os pesquisadores ficaram quatro anos calibrando os equipamentos e registrando as imagens coletadas para poder provar que o movimento identificado não era um erro na captação.
"Uma vez que você consegue fazer a observação em três dimensões, a
pergunta principal se torna como é que a cauda bate realmente", contou o
brasileiro. "Para responder a essa pergunta, tem que ir para o
referencial do espermatozoide, é quase como se você pegasse uma 'Go Pro'
e colasse na cabeça do gameta."
"Essa pesquisa é um casamento de várias áreas do conhecimento",
explicou o matemático.
"Somos biólogos, engenheiros, matemáticos
trabalhando juntos. Só a observação no microscópio não é suficiente,
precisamos combinar com a modelagem matemática, mas ela sozinha não vai
dar as respostas."
Ciência de base
A descoberta dos pesquisadores abre caminho para entender melhor os
mecanismos da origem de todos nós: "Eu não estaria aqui se não tivesse
um espermatozoide chegado a um óvulo", reforçou o cientista e professor
de matemática aplicada.
A próxima pergunta que eles fazem é justamente qual a relevância deste
movimento para a infertilidade. Gadêlha explicou que muitos testes de
fertilidade humana levam em conta a forma com que os gametas masculinos
conseguem nadar.
"A única coisa que eu posso dizer, é que isso é menos de 10% do que a
gente ainda estuda", disse o pesquisador. "Vendo no microscópio, o
futuro parece muito mágico."
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