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segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

Medo de represália inibia denúncias sobre crise dos yanomami, diz médica

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Pediatra esteve nos lugares mais afetados do território indígena yanomami no final de 2022 e conta como a saúde e o modo de vida da população local são afetados pelo garimpo. Ela também entende que a maior atenção à emergência de saúde nos últimos dias se deve à possibilidade de diálogo e mudanças recentes no Ministério da Saúde.
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TOPO
Por André Biernath, BBC

Postado em 23 de janeiro de 2023 às 21h30m

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Médicos reforça necessidade de ajuda humanitária após saída de garimpeiros de terras yanomami — Foto: EXPEDICIONÁRIOS DA SAÚDE
Médicos reforça necessidade de ajuda humanitária após saída de garimpeiros de terras yanomami — Foto: EXPEDICIONÁRIOS DA SAÚDE

A pediatra Priscila Tatiana Gonçalves, de Taubaté (SP), realiza atendimentos com indígenas há quase uma década.

Ela é uma das voluntárias da ONG Expedicionários da Saúde (EDS), que desde 2004 planeja expedições para realizar consultas, exames e cirurgias em territórios indígenas espalhados pela Amazônia.

Em novembro de 2022, a médica integrou uma comitiva que realizou uma ação emergencial de saúde no território yanomami.

Ao longo de dez dias, ela integrou uma equipe com outro colega médico e dois enfermeiros que visitou cinco unidades de saúde indígena (Casai-Boa Vista, Xitei, Surucucu, Missão Catrimani e Demini), fez atendimentos médicos e distribuiu insumos e medicamentos básicos.

Em entrevista à BBC News Brasil, Gonçalves disse que o cenário já era "terrível" e "absurdo". Ela também explicou que a crise só ganhou uma proporção maior agora porque há uma "abertura para diálogo" e menos risco de represálias.

"Até recentemente, algumas enfermeiras que atuam nesses locais compartilhavam histórias de que sofriam vários tipos de repressão. Alguns profissionais de saúde que trabalhavam lá há anos foram demitidos desde que a coordenação do serviço foi trocada. E os coordenadores que foram nomeados não tinham nenhuma afinidade com o assunto, nunca trabalharam com saúde indígena", relatou.

A pediatra também destacou alguns casos marcantes que marcaram os dez dias de trabalho — como a morte de uma criança indígena com malária cerebral que estava numa região remota, sem acesso a qualquer tratamento.

Ela ainda ponderou sobre a necessidade de suporte aos indígenas assim que os garimpeiros forem expulsos da região.

"Temos que pensar como ficará a situação desses indígenas a partir de agora. O que vai acontecer se todos os garimpeiros forem retirados dali de uma hora para outra? Muitos jovens estão envolvidos nesse trabalho. [...] Num primeiro momento, a saída dos garimpos será ruim para alguns. Porque os indígenas já não têm nada e, quando sair esse garimpeiro que dá saco de arroz e espingarda, vai demorar um certo tempo até eles conseguirem voltar ao modo de vida que tinham antes", aponta.

Confira os principais trechos da entrevista a seguir.

BBC News Brasil - Como a senhora teve contato com os yanomami?

Priscila Tatiana Gonçalves - Eu participo de expedições da EDS desde 2014 e 2015. As expedições são mais voltadas para a área cirúrgica, mas também temos uma parte clínica. Até porque nós vamos para territórios onde muitas vezes não existem médicos fazendo atendimento clínico.

Normalmente, as equipes de saúde nesses lugares são formadas por enfermeiros e técnicos de enfermagem. Então, funcionamos como um complemento à expedição.

Em relação aos yanomami especificamente, nós já estávamos vendo a situação piorar de forma muito assustadora nos últimos anos. Foi por isso que fomos até lá. Normalmente, nós sempre ouvimos as lideranças locais, com quem a EDS tem um contato muito próximo por causa do vínculo que foi criado ao longo de todos esses anos.

Numa das últimas expedições, fomos até a Casa de Saúde Indígena Yanomami, em Boa Vista, e identificamos um cenário que já era terrível. Era exatamente o que veríamos pouco depois, nas denúncias que ganharam o noticiário nos últimos dias.

Depois disso, começamos a entrar em contato com as lideranças, para conseguirmos fazer as entradas nessas regiões específicas, que estavam sem atendimento. E é muito difícil chegar até lá.

É preciso ir por via aérea e necessitamos de suporte. Normalmente, as expedições da EDS contam com o apoio do Ministério da Defesa e da Força Aérea Brasileira (FAB). Mas nos últimos trabalhos precisamos contactar diretamente os representantes de cada região.

Nessa região onde vivem os yanomami, sabíamos que eles não estavam recebendo as medicações. Também tínhamos ciência de que entrar ali era um risco para nós mesmos. Porque estávamos num local sem acesso a água e luz, em que precisávamos dormir dentro dos centros de saúde, cercados pelo garimpo.

E é muito difícil falar sobre o que vimos lá. A situação era absurda. Voltamos já pensando em um plano de ação, tentando contato com os Médicos Sem Fronteiras e a Unicef. O déficit nutricional era gritante. Crianças e idosos estavam muito desnutridos. Praticamente todos estavam nessa condição.

"Crianças e idosos estavam muito desnutridos", diz médica — Foto: EXPEDICIONÁRIOS DA SAÚDE
"Crianças e idosos estavam muito desnutridos", diz médica — Foto: EXPEDICIONÁRIOS DA SAÚDE

E é curioso, porque há áreas dentro do território yanomami onde praticamente não há desnutrição. Fomos, por exemplo, para uma região chamada Demini e ali as crianças estão saudáveis, não tem malária, nem garimpo.

Então vimos situações completamente diferentes dentro de um mesmo território, uma mesma população. E não há justificativa para tudo o que está acontecendo. Falta medicamento, falta assistência de saúde.

BBC News Brasil - Mas a senhora teve contatos anteriores com os yanomami? A situação era diferente em outras situações?

Gonçalves - Sim, geralmente a logística é um pouco diferente quando vamos para alguma área onde os yanomami estão próximos. Nós vamos até eles e fazemos uma triagem, até pelo fato de ser uma comunidade coesa e não ter muito contato com outros grupos. Nós fazemos então o atendimento deles, muitas vezes até antes da expedição começar.

BBC News Brasil - Mas se o problema com os yanomami já acontece há alguns anos, por que ele ganhou essa dimensão nacional só agora? A situação de fato piorou recentemente ou ela foi sempre ruim?

Gonçalves - A situação é completamente diferente nas regiões de serra, pois os yanomami que habitam esses locais já têm uma dificuldade maior de obter alimentos. O que vimos recentemente, e está muito claro em relatórios de outras instituições, como o Instituto Socioambiental, é o avanço das áreas de garimpo.

Nós descemos nas mesmas pistas usadas pelos garimpeiros e eles estavam o tempo todo com a gente. Outra coisa que observamos foi a contaminação da água. As mulheres yanomami costumam passar o dia coletando pequenos crustáceos em igarapés, que são uma fonte importante de proteína. Outras fontes de proteína são a caça e a pesca. E dava pra ver que eles simplesmente não tinham mais acesso a isso. Ou seja, não tinham como obter os tipos de proteína mais comuns da dieta deles.

Mesmo as frutas estavam diferentes. Eles consomem o jambo, que é uma fruta grande. Nessa última entrada, vimos indígenas comendo o fruto pequeno, ainda verde, porque não tinham outras opções de alimento.

As crianças que atendemos estavam muito desnutridas e pareciam estar há anos sem receber nenhum tipo de medicamento, como os vermífugos. Algumas eliminavam vermes pela boca. Outras tinham o abdômen muito amplo, um sinal claro de verminose, e as demais partes do corpo muito emagrecidas, num claro sinal de desnutrição. Numa situação dessas, qualquer problema de diarreia ou pneumonia pode levar a óbito em poucos dias.

Ou seja, as crianças das regiões de garimpo eram muito diferentes de qualquer indígena de outras áreas. A diferença é muito gritante. Quando chegamos, olhamos aquilo e ficamos sem saber por onde começar. Sabíamos que a situação era grave. Sabíamos que as crianças precisavam sair dali para fazer uma recuperação nutricional numa clínica. Mas isso era impossível, não conseguiríamos remover todos aqueles jovens para deixá-los 30 ou 40 dias internados num outro lugar.

Em outros territórios indígenas, até vemos quadros de desnutrição. Mas eles são agudos, provocados por uma deficiência nutricional específica, porque faltou algum alimento temporariamente. Em certas regiões yanomami, o problema era geral. Vimos desnutrição, casos de malária sem tratamento, quadros com diarreia e pneumonia. E o pior de tudo é que todas são doenças com tratamento. Dava pra ver que as crianças estavam tristes, quando o estado normal delas é de alegria, de brincar o tempo todo, de interagir com os outros.

BBC News Brasil - Mas quantas crianças eram acometidas por esse quadro que a senhora descreveu? Qual a proporção de afetados em relação ao tamanho da população?

Gonçalves - Para você ter uma ideia, visitamos regiões com cerca de 150 indígenas, dos quais 40 eram crianças. Dessas, ao redor de 30 se encontravam num estado de desnutrição grave e as outras 10 estavam em vias de iniciar um quadro desses. Esses não são números exatos, mas dão uma ideia do tamanho do problema.

Um dos enfermeiros que estava com a gente relatou que foi para o Haiti em 2010. Naquela catástrofe, as pessoas andavam pelas ruas sem rumo. E ali, nessa região yanomami, a sensação era a mesma. Estávamos diante da catástrofe de toda uma população.

A região do Surucucu conta com um centro de saúde em que há um médico. E comunidades inteiras vão para lá, após caminharem por quatro, cinco ou seis dias. Eles preferem ficar perto desse posto porque sabem que ali há a possibilidade de comer e receber tratamento. Eu nunca estive num campo de refugiados de guerra, mas acredito que a situação que vimos era similar.

BBC News Brasil - Mas esse é um problema que se acentuou nos últimos anos? Ou é algo que já se arrasta por décadas?

Gonçalves - Eu não consigo contabilizar exatamente isso, mas o que vimos nesses últimos quatro anos foi o fechamento de muitos dos centros de saúde da região. Alguns deles, inclusive, foram convertidos em áreas de garimpo. Os garimpeiros tomaram conta desses centros, a ponto de os profissionais de saúde não conseguirem mais entrar ali.

Ou seja, a população local deixou de ter acesso às consultas de rotina e à vacinação. Fora que, diante de um problema de saúde grave, você não consegue transferir a criança ou o adulto para um centro mais capacitado.

Outro ponto é que as medicações não chegavam. Na entrada que fizemos no final de 2022, compramos remédios contra verminoses. O Ministério da Saúde tem alguns protocolos que determinam a aplicação desses remédios de tempos em tempos. Pelo menos uma vez por ano, você oferece esse tratamento para eliminar os vermes daquela população.

Isso é importante para que as crianças consigam ter um desenvolvimento nutricional adequado. Agora, se ela tem uma verminose importante, esse é mais um motivo para que tenha uma perda de desenvolvimento.

Vimos que todas aquelas crianças estavam sem receber a medicação há anos. Se você olhar as listas do Ministério da Saúde, há informação de que o remédio foi comprado e entregue. Mas ele nunca chegou até lá.

BBC News Brasil - Na visão da senhora, o que levou a esse cenário? Como a situação chegou a esse ponto?

Gonçalves - Eu não sei. Nesses últimos quatro anos, a EDS recebeu muitos pedidos de socorro dos yanomami. Nós já fizemos expedições lá, então eles conheciam nosso trabalho e sabiam que chegamos com uma estrutura, com a possibilidade de fazer tratamentos médicos e prover alimentos na medida do possível.

Quando começamos a fazer o contato para a última entrada, no final de 2022, nossos pedidos foram negados o tempo todo por parte do ministério, da FAB e de todos os outros suportes. Então resolvemos ir até lá mesmo assim, com o auxílio das lideranças locais, para ver se como estava essa região do Surucucu.

Conversamos com agentes de saúde indígena, enfermeiros e técnicos de enfermagem que trabalham no local há 10 ou 15 anos, e eles disseram que nunca viram algo assim.

Outra coisa que chamou nossa atenção aconteceu na Casai Yanomami, que fica em Boa Vista. Vimos dezenas de famílias inteiras que estavam ali abandonadas. Por que esses indivíduos estavam ali? Não fazia o menor sentido. Eles chegaram lá para fazer algum atendimento na cidade e receberam a recomendação de suporte nutricional. Só que eles estavam lá por um ano, sem nenhuma perspectiva de voltar para a comunidade deles. Não fazia sentido do ponto de saúde estarem ali, pois já deveriam ter recebido alta há tempos.

BBC News Brasil - A senhora mencionou a falta de autorização e suporte do Governo Federal. Existia algum bloqueio em falar sobre a crise de saúde dos yanomami? Se sim, isso contribuiu para que o assunto só ganhasse uma proporção maior agora, com a transição de governos?

Gonçalves - Eu acho que as próprias mudanças recentes nas coordenadorias de saúde indígena e no Ministério da Saúde facilitaram isso, pois abrem o diálogo e tentam fazer uma união. Porque esse é um problema que ninguém conseguirá resolver sozinho. Precisamos de uma frente.

Essas populações conseguem viver muito bem. Basta a gente não atrapalhar. Agora, eles estão nessa situação de risco, então é uma obrigação nossa de pelo menos ajudá-los a sair dessa urgência.

Acho que a gente pode falar agora, porque sabemos que eles não vão sofrer represálias. Até recentemente, algumas enfermeiras que atuam nesses locais compartilhavam histórias de que sofriam vários tipos de repressão. Alguns profissionais de saúde que trabalhavam lá há anos foram demitidos desde que a coordenação do serviço foi trocada. E os coordenadores que foram nomeados não tinham nenhuma afinidade com o assunto, nunca trabalharam com saúde indígena

BBC News Brasil - Durante a última entrada no território yanomami, a senhora testemunhou alguma história que chamou mais a sua atenção?

Gonçalves - Sim, atendemos uma criança com malária cerebral [complicação da infecção marcada por febre alta, dor de cabeça, sonolência, delírio, confusão, convulsões e coma].

Ela provavelmente estava malária e começou a ter convulsões. O problema era que só tínhamos o contato pelo rádio, porque não conseguimos chegar aonde ela estava. Passamos a madrugada toda em contato pelo rádio, falando com o técnico de enfermagem que estava lá. Mas ele não tinha nenhum remédio para convulsão. Ela também não tinha iniciado o tratamento de malária, porque esse remédio também estava em falta.

Ficamos em contato pelo rádio, mas a situação era precária. A antena não funcionava direito. Então ficava uma pessoa segurando a antena, e outra falando pelo aparelho. Passamos a madrugada toda tentando chamar o socorro aéreo, para que ele fosse até a comunidade para resgatar essa criança. No final, a criança faleceu.

Outra história que nos marcou foi a de uma criança que estava provavelmente com infecção respiratória. Felizmente, ela conseguiu ser levada até onde estávamos. Lá, tínhamos energia elétrica e um pequeno gerador para fazer a oxigenação. Teve um momento, também de madrugada, que a luz acabou e ficamos contando as horas para chegar o socorro aéreo. Felizmente conseguimos transferi-la a tempo.

Na maioria das vezes, essas situações são evitáveis. O mínimo que esperamos é ter oxigênio, água e medicações como analgésicos e antibióticos. Pelo menos, assim conseguimos estabilizar o quadro e aliviar o sofrimento enquanto não chega o transporte para um hospital.

Para piorar, muitas dessas situações estavam controladas no passado. A malária, por exemplo, estava praticamente eliminada dessa região. Não tínhamos quadros de desnutrição dessa gravidade. E tudo piorou de forma absurda em poucos anos. É algo muito difícil de entender e de falar. Eu nunca imaginei que veria uma coisa dessas.

BBC News Brasil - Do ponto de vista técnico, como todas essas questões engatilhadas a partir do garimpo — como a malária, a desnutrição e a falta de assistência em saúde — afetam a saúde das crianças?

Gonçalves - A falta de um aporte nutricional adequado faz com que a criança sofra com o agravamento de várias outras doenças. Além disso, a desnutrição impede o desenvolvimento do cérebro e do corpo.

E foi o que vimos nesta última entrada que fizemos. As famílias não tinham mais roças, frutas para consumo, pesca, caça ou crustáceos. Isso porque as comunidades geralmente ficam próximas de uma fonte de água, como um rio ou um igarapé. Só que o garimpo se instalou junto das aldeias.

Vimos igarapés completamente degradados, com água amarela, com manchas de contaminação. Naquela água, não existem mais condições de vida para os peixes.

Para completar, a presença do garimpo afasta a caça. Os garimpeiros usam helicópteros e outras máquinas grandes e barulhentas. Isso assusta os animais, que vão para outros lugares.

Todas essas mudanças levam, inclusive, a confrontos entre os indígenas. Porque há grupos que são mais favoráveis aos garimpeiros, enquanto outros são contra. Cheguei a ver crianças pequenas com espingardas nas mãos. Essas armas eram trocadas por trabalho. Elas ficavam o dia todo recolhendo cassiterita [um tipo de minério]. Eram quilos e quilos. Esse material era colocado em sacolas para depois ser recolhido por um helicóptero. Esse trabalho é pago com sacos de arroz ou pequenas espingardas.

BBC News Brasil - Vocês sofreram alguma ameaça de garimpeiros enquanto estiveram por lá?

Gonçalves - Nós tínhamos contato com eles o tempo todo. Durante o dia inteiro, ouvíamos a chegada dos helicópteros dos garimpeiros. Não sei quantificar com exatidão, mas era uma nova aeronave subindo e descendo a cada duas horas mais ou menos. Foi aí que percebemos que estávamos trabalhando numa situação de risco. De vez em quando, ouvíamos alguns tiros. Quando perguntávamos para os indígenas que estavam por perto, eles diziam que era briga.

Também temos que pensar como ficará a situação desses indígenas a partir de agora. O que vai acontecer se todos os garimpeiros forem retirados dali de uma hora para outra? Muitos jovens estão envolvidos nesse trabalho de garimpo, de recolher a cassiterita. Num primeiro momento, a saída dos garimpeiros será ruim. Porque eles já não têm nada. Porém, quando esse garimpeiro, que dá saco de arroz e espingarda, for embora, vai demorar um certo tempo até conseguirem voltar ao modo de vida deles. Até esse período de adaptação, eles não terão o alimento. E já não têm saúde.

Muitos indígenas com quem conversamos sempre falavam que o mais importante de tudo é a saúde. E eles precisarão de algum suporte até que decidam como vai ser a vida depois. Eles têm essa autonomia e esse direito. Eles sabem exatamente o que querem. Basta não atrapalharmos.

Tivemos no passado outras comunidades invadidas pelo garimpo que foram desestruturadas e depois conseguiram restabelecer os modos de vida tradicionais. Mas eles precisarão de ajuda neste período de transição em que passarão a viver sem os garimpeiros.

Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-64381594

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Com retração da indústria, Brasil exporta mais para o Oriente Médio do que para Argentina

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Dinâmica é um retrato da perda de espaço de produtos manufaturados brasileiros no comércio global; país tem vendido cada vez mais commodities para o mundo.
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Por BBC

Postado em 23 de janeiro de 2023 às 11h00m

 #.*Post. - N.\ 10.645*.#

Presidente argentino na posse de Lula: país vizinho é o principal destino de produtos industriais do Brasil — Foto: Ricardo Moraes/Reuters
Presidente argentino na posse de Lula: país vizinho é o principal destino de produtos industriais do Brasil — Foto: Ricardo Moraes/Reuters

No ano 2000, 59% do que o Brasil vendeu para o mundo foram produtos manufaturados pela indústria. Em duas décadas, essa participação caiu a menos da metade - 28% em 2022, conforme os dados compilados pela Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).

Soja, milho, petróleo, minério de ferro e carne responderam por cerca de metade de tudo o que o Brasil embarcou para o mundo no ano passado.

A mudança de perfil da pauta de exportações acabou mexendo com a lista dos principais destinos de produtos brasileiros. Hoje, o Brasil vende mais para o Oriente Médio, por exemplo, do que para a vizinha Argentina, destino da primeira visita oficial do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que desembarcou em Buenos Aires neste 22 de janeiro.

A inversão é reflexo do avanço das commodities nas relações comerciais do Brasil com a comunidade internacional. Enquanto a Argentina é o principal destino dos bens manufaturados produzidos pela indústria brasileira, especialmente a automotiva, o Oriente Médio compra principalmente carnes de aves (17%), milho (16%), minério de ferro (14%), soja (11%), açúcares e melaços (10%) e carne bovina (5%).

O dólar e a polêmica da moeda comum

Uma das principais razões para a perda de espaço é a crise longa pela qual passa o país vizinho, avalia José Augusto de Castro, presidente-executivo da AEB.

"A Argentina tem um problema sério de falta de dólares", diz ele, referindo-se ao nível baixo de reservas cambiais, hoje em US$ 42,9 bilhões. Para efeito de comparação, o Brasil, por exemplo, soma US$ 324,7 bilhões em reservas internacionais.

Para evitar a saída de dólares, o governo argentino com frequência impõe restrições às importações, o que afeta diretamente seus principais parceiros comerciais.

Uma saída para tentar aumentar o fluxo de comércio entre Brasil e Argentina seria transacionar em uma moeda que não fosse o dólar - daí a ideia que circulou após a reunião entre o embaixador argentino, Daniel Scioli, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no dia 3 de janeiro em Brasília, e que acabou gerando ruído.

Ao sair do encontro, Scioli falou sobre a possibilidade de criação de uma moeda comum para o Mercosul. Dias depois, Haddad se irritou ao ser questionado por um jornalista sobre a possibilidade de adoção de uma moeda única pelo bloco.

A ideia, de fato, não seria criar uma moeda única (como o euro), mas uma moeda estrutural que pudesse ser usada como mecanismo de compensação no comércio bilateral entre os dois países, diz Welber Barral, especialista em comércio internacional e sócio-fundador da consultoria BMJ.

Ele lembra que o Brasil já conta com um Sistema de Pagamentos em Moeda Local, em que Argentina e Uruguai podem pagar em suas respectivas moedas, mas é preciso fazer uma compensação diária em dólares.

"Na prática, [com esse sistema] persiste o problema das reservas cambiais."

Para ele, a moeda comum poderia ser um mecanismo para contornar o problema, mas "haveria uma questão política a ser tratada com a Argentina sobre os riscos de calote". Castro, por sua vez, acha que a ideia é de difícil implementação.

O presidente argentino, Bolsonaro e Lula

A visita de Lula será a primeira de um presidente brasileiro ao líder argentino Alberto Fernández.

Jair Bolsonaro (PL) viajou ao país em 2019, quando o rival de Fernández, Mauricio Macri, ainda estava na Casa Rosada. Desde que a Frente de Todos - a coalizão de partidos de esquerda peronistas e kirchneristas que ganhou as eleições - assumiu o poder, ele não foi mais à região.

O primeiro encontro entre os dois aconteceu em junho de 2022, na Cúpula das Américas em Los Angeles.

Na visão de Barral, o distanciamento na relação bilateral nos anos de Bolsonaro não chegou a afetar de forma significativa a relação comercial entre Brasil e Argentina, que ele considera muito estável.

O especialista aponta, contudo, que algumas das políticas da gestão passada acabaram contribuindo para esfriar o fluxo de comércio entre os dois países, entre eles a interrupção do programa de financiamento às exportações pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Em sua avaliação, essa era uma política que deveria ser retomada.

De forma mais ampla, Barral afirma que o Brasil "ficou muito isolado internacionalmente nos últimos anos" e que tem agora a oportunidade de "retomar o protagonismo internacional, principalmente considerando os vizinhos".

"A Argentina vai continuar a ser um vizinho importante e o Brasil tem que melhorar o relacionamento com ela - então essa visita é importante."

Os quadros do peronismo argentino têm proximidade com o Partido dos Trabalhadores (PT). Na noite em que Fernández venceu as eleições, em 27 de outubro de 2019, um grupo grande de petistas participou das comemorações em Buenos Aires. Entre militantes, integrantes da direção do partido, parlamentares e ex-parlamentares estavam o ex-senador e agora deputado Lindbergh Farias e o atual presidente do BNDES Aloizio Mercadante.

O próprio presidente argentino é próximo de Lula. Ainda em campanha, em 2019, chegou a visitá-lo na prisão em Curitiba.

Recorde de exportações para o Oriente Médio

O aumento dos embarques do Brasil para o Oriente Médio, por sua vez, é um retato da primarização da pauta de exportações brasileira.

Nos últimos anos, o país tem vendido cada vez mais produtos básicos, muitos com um nível baixo de diferenciação.

Tamer Mansour, secretário-geral da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira, dá o exemplo concreto do café: o Brasil vende especialmente o grão in natura para os países árabes, quando poderia oferecer, por exemplo, café em pó, mais caro e com maior valor agregado.

"Nós temos os achocolatados, sucos, óleo de soja, de milho... no caso desses produtos, infelizmente, a gente só exporta para os árabes as commodities", comenta.

Para além da indústria alimentícia, ele diz, o Brasil teria o potencial para vender também produtos farmacêuticos, cosméticos e relacionados à moda à região.

"Acho que o Brasil precisa se destacar um pouco mais, precisa entender que essa cúpula do mundo árabe, especialmente da parte do Golfo, tem como absorver produtos de maior valor agregado de origem brasileira."

Os US$ 17,2 bilhões que o Brasil embarcou para a região em 2022 são o maior valor da série histórica da Secretaria de Comércio Exterior, que começa em 1997.

O primeiro destino foi o Irã. Milho e soja responderam por 80% dos US$ 4.3 bilhões vendidos ao país persa. Entre os árabes, os principais mercados foram os Emirados Árabes Unidos (US$ 3,3 bilhões), que têm se tornado um hub de distribuição de produtos para a Ásia Central, e a Arábia Saudita (US$ 2,9 bilhões).

Na avaliação de Mansour, parte do aumento das exportações para os países árabes se deve à valorização dos preços de commodities no ano passado e à Copa do Catar, que contribuiu para elevar a demanda por produtos básicos.

A relação da gestão Bolsonaro com os países da região teve um início turbulento com a proposta, em 2019, de transferir a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, cidade disputada por israelenses e palestinos. O governo recuou da ideia e, com o tempo, passou a acenar mais aos países da região, especialmente por meio do Ministério da Agricultura.

"Isso nos causou um desconforto inicial. Eu acho que o governo - especialmente, naquela época, a Tereza Cristina (ministra da Agricultura) - conseguiu muito bem contornar a situação, absorver a importância do mundo árabe no agro brasileiro."

Sobre o terceiro mandato de Lula, Mansour diz acreditar que a relação com a região deve se estreitar e cita a visita do presidente ao Egito antes de sua posse, em novembro, para participar da Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP 27).

"Foi o presidente Lula que desenvolveu a Cúpula Aspa [Cúpula América do Sul - Países Árabes, inaugurada em 2005], então isso mostra como esse governo deve olhar com profundidade para os países árabes", acrescenta.

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domingo, 22 de janeiro de 2023

Ferrari F40 do chefão da Mercedes na F1 está à venda e preço pode superar os R$ 10 milhões

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Superesportivo traz sob o capô um V8 de 477 cv e foi a primeira da marca a passar de 320 km/h
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Por Thais Villaça

Postado em 22 de janeiro de 2023 às 11h45m

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Ferrari F40 de Toto WolffFerrari F40 de Toto Wolff Tom Hartley Jr

O chefão da Mercedes-Benz na Fórmula 1 está vendendo sua… Ferrari! Rivalidades (e brincadeiras) à parte entre as equipes, Toto Wolff, o big boss que comanda a Mercedes, tem uma invejável coleção de carros.

F40 é a terceira Ferrari de Toto Wolff à venda nos últimos dois anos — Foto: Tom Hartley Jr
F40 é a terceira Ferrari de Toto Wolff à venda nos últimos dois anos — Foto: Tom Hartley Jr

A Ferrari F40 do diretor executivo que está à venda não é a única da marca italiana em sua garagem milionária (e há outros tantos da alemã também, é claro).

O superesportivo está listado na concessionária britânica Tom Hartley Jr., a mesma que negociou outros carros de Wolff em 2021, como as Ferrari LaFerrari Aperta e Enzo e o Mercedes-AMG SL 65 Black Series.

Ferrari F40 foi produzida entre 1987 e 1992 — Foto: Tom Hartley Jr
Ferrari F40 foi produzida entre 1987 e 1992 — Foto: Tom Hartley Jr

Na época, ele disse que estava vendendo esses modelos simplesmente porque não tinha tempo de dirigi-los. Levando em consideração as 23 etapas do calendário da Fórmula 1, esse é provavelmente o mesmo motivo para Wolff se desfazer de mais um xodó de sua coleção.

Toto Wolff comanda a equipe da Mercedes na Fórmula 1 desde 2013 — Foto: Divulgação
Toto Wolff comanda a equipe da Mercedes na Fórmula 1 desde 2013 — Foto: Divulgação

A F40 passou recentemente por uma restauração completa pelas mãos da Autofficina Bonino Carlo e tem apenas 5.536 km marcados no hodômetro. O carro é uma das 27 unidades originalmente vendidas na Espanha durante sua produção, entre 1987 e 1992.

Ferrari F40 de Toto Wolff foi totalmente restaurada e está impecável — Foto: Tom Hartley Jr
Ferrari F40 de Toto Wolff foi totalmente restaurada e está impecável — Foto: Tom Hartley Jr

Toda a documentação do superesportivo está em dia, incluindo um certificado do departamento de clássicos da Ferrari confirmando a originalidade de chassi, carroceria, motor e transmissão.

Hodômetro marca somente 5.536 km — Foto: Tom Hartley Jr
Hodômetro marca somente 5.536 km — Foto: Tom Hartley Jr

No auge de seu lançamento, a F40 era o modelo mais rápido, potente e caro no portfólio da marca italiana. Seu motor 2.9 V8 biturbo, uma derivação do usado na 288 GTO Evoluzione, é capaz de render 477 cv de potência.

Motor da F40 é derivado da 288 GTO Evoluzione  — Foto: Tom Hartley Jr
Motor da F40 é derivado da 288 GTO Evoluzione — Foto: Tom Hartley Jr

Ela foi ainda a primeira Ferrari a ultrapassar a barreira dos 320 km/h de velocidade máxima. Não há preço listado para o veículo na loja, mas nas condições que a F40 de Wolff se encontra, é provável que o valor seja superior a US$ 2 milhões (cerca de R$ 10,4 milhões na atual cotação).

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sábado, 21 de janeiro de 2023

Cientistas descobrem uma nova estrutura no cérebro humano

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Pesquisadores dos Estados Unidos e da Dinamarca descreveram uma nova região que, segundo eles, pode atuar como uma barreira para proteger os neurônios e as demais células nervosas.
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TOPO
Por BBC

Postado em 21 de janeiro de 2023 às 13h30m

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Com uma intrincada rede de neurônios e outras estruturas biológicas, o cérebro continua a se mostrar uma máquina difícil de decifrar. — Foto: BBC
Com uma intrincada rede de neurônios e outras estruturas biológicas, o cérebro continua a se mostrar uma máquina difícil de decifrar. — Foto: BBC

Com uma intrincada rede de neurônios e outras estruturas biológicas, o cérebro continua a se mostrar uma máquina difícil de decifrar.

Agora, graças aos avanços nas técnicas de neuroimagem e biologia molecular, cientistas dos Estados Unidos e da Dinamarca descobriram uma nova estrutura no cérebro.

Eles a chamaram de SLYM, sigla em inglês para Subarachnoid Membrane Lymph Type (ou Membrana Subaracnoide do Tipo Linfático, em tradução livre).

O grupo de especialistas descreveu a estrutura como um componente desconhecido da anatomia do cérebro que atua como uma barreira protetora e uma plataforma para monitorar infecções e inflamações.

A descoberta, publicada no periódico especializado Science, foi feita por cientistas do Centro de Neuromedicina Translacional da Universidade de Rochester (EUA) e da Universidade de Copenhague (Dinamarca).

'Quarta meninge'

O cérebro é coberto por três membranas, chamadas de meninges: a pia-máter, a aracnóide e dura-máter. Esses tecidos criam uma barreira entre o sistema nervoso central e o resto do corpo.

Entre a pia-máter e a aracnoide, existe uma abertura conhecida como espaço subaracnoideo, que é preenchida com líquido cefalorraquidiano. Esse material flui dentro e ao redor do cérebro para ajudar a amortecê-lo e como uma fonte de nutrientes.

A nova estrutura recém-descoberta seria uma quarta membrana localizada dentro do espaço subaracnoideo, acima da pia-máter, que é a membrana mais interna.

Como explicam os pesquisadores, além de revestir o órgão, a SLYM parece ajudar a controlar o fluxo de líquido cefalorraquidiano para dentro e para fora do cérebro.

"Nossa hipótese é que a SLYM atue como uma barreira entre o líquido cefalorraquidiano 'limpo', que entra no cérebro, e o 'sujo', que sai do órgão, arrastando resíduos de proteínas com ele", explica a neurocientista Virginia Plá Requena, do Centro de Neuromedicina Translacional da Universidade de Copenhague e uma das autoras do estudo.

"Consequentemente, a deterioração dessa membrana dificultaria a limpeza do cérebro o que, por sua vez, afetaria a função neuronal", acrescenta.

— Foto: BBC
— Foto: BBC

De fato, os pesquisadores acreditam que a descoberta da SLYM representa um novo nível de organização na circulação do líquido cefalorraquidiano.

Segundo eles, a presença da nova membrana parece confirmar o papel sofisticado que esse fluido desempenha na manutenção das defesas imunológicas do cérebro e no transporte e na eliminação de resíduos tóxicos.

Grande parte desse "lixo tóxico" tem sido associado a doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e outras enfermidades que afetam o sistema nervoso central.

'Mesotélio do cérebro'

Os cientistas explicaram que a SLYM é uma espécie de mesotélio, um tipo de membrana que recobre outras partes do corpo, como os pulmões e o coração.

Esses tecidos protegem os órgãos vitais e armazenam células imunológicas.

Os pesquisadores americanos e dinamarqueses sugerem que a SLYM é o mesotélio do sistema nervoso central, e reveste os vasos sanguíneos na cavidade que existe entre o cérebro e o crânio.

O tecido recém-descoberto também poderia atuar como um lubrificante nessa cavidade.

"Pulsações fisiológicas induzidas pelo sistema cardiovascular, pela respiração e por mudanças na posição da cabeça movem constantemente o cérebro dentro da cavidade craniana", explicam os pesquisadores.

"Como outros mesotélios, a SLYM pode reduzir o atrito entre o cérebro e o crânio durante esses movimentos", complementam.

A membrana foi descrita pela primeira vez em camundongos, mas os pesquisadores dizem que mais tarde foram capazes de detectá-la também em cérebros humanos doados para pesquisa.

Eles explicam que não foi possível observá-la antes porque o material se desintegra quando o cérebro é extraído do crânio durante as autópsias.

Além disso, dizem eles, trata-se de uma membrana muita fina — com apenas algumas células de espessura — que não pode ser vista em pessoas vivas por meio de exames de imagem convencionais.

Os resíduos das células cerebrais incluem a chamada proteína beta-amilóide, que pode estar envolvida com a doença de Alzheimer — Foto: BBC
Os resíduos das células cerebrais incluem a chamada proteína beta-amilóide, que pode estar envolvida com a doença de Alzheimer — Foto: BBC

Sistema glinfático

Há dez anos, a mesma equipe de neurocientistas das universidades de Rochester e de Copenhague transformou a compreensão dos processos e da mecânica do cérebro ao publicar a descoberta do chamado sistema glinfático.

Eles descreveram a descoberta como um mecanismo cuja função é eliminar ou limpar os resíduos que se acumulam no cérebro.

Esse material inclui as proteínas beta-amilóide e TAU, que parecem estar envolvidas na doença de Alzheimer e se acumulam no cérebro dos pacientes acometidos por esse tipo de demência.

Desde então, várias equipes de especialistas vêm realizando estudos para desvendar exatamente como funciona o sistema glinfático, por que ele falha algumas vezes e o que acontece no cérebro desses indivíduos acometidos pelo problema.

Os acadêmicos acreditam que a descoberta da membrana SLYM pode ter implicações importantes para a compreensão das funções exatas do sistema glinfático.

E isso, por sua vez, abriria as portas para novas pesquisas, que podem monitorar essa estrutura e observar sinais de infecção ou de inflamação por trás das doenças do sistema nervoso central.

Os pesquisadores sugerem, por exemplo, que a deterioração da membrana pode dificultar a remoção de resíduos tóxicos que contribuem para as placas que levam ao Alzheimer.

Essa estrutura também desempenharia um papel na defesa do cérebro, impedindo que células imunes estranhas entrem em contato com a população nativa de células cerebrais, o que contribuiria para a inflamação e a progressão do declínio cognitivo.

Nos próximos anos, pesquisas serão feitas para determinar as implicações da existência da SLYM.

Mas, como garante a neurocientista Virginia Plá, entender como essa membrana funciona pode ser a chave para a criação de novos tratamentos, como remédios que possam atravessar a barreira hematoencefálica e agir diretamente no cérebro.

Além disso, devido à sua localização, a estrutura recém-descoberta poderia ser "um elemento-chave em processos inflamatórios, como os que ocorrem em traumatismos cranianos, meningites e esclerose múltipla".

"Finalmente, saber como essa membrana muda em resposta à neurodegeneração ou ao envelhecimento pode ser essencial para as intervenções que tentam preservar a função cognitiva", completa a pesquisadora.

O professor Jordi Vilaplana, do Departamento de Bioquímica e Fisiologia da Universidade de Barcelona, na Espanha, considera que a possível presença dessa membrana "é muito interessante".

"Trata-se de mais um elemento na compreensão do funcionamento do sistema glinfático, sobre o qual ainda permanecem algumas dúvidas sobre a estrutura e o funcionamento dele", afirma o pesquisador, que não esteve envolvido diretamente no estudo.

"No entanto, do meu ponto de vista, a principal revolução é a descoberta do próprio sistema glinfático e seu possível envolvimento com as doenças neurodegenerativas", conclui o especialista.

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